Exorcismo…

— Fédaputa!

A mãe pensa não ter entendido. O garoto mal completara três anos de idade. Jamais seria capaz de proferir uma obscenidade dessas.

— Você disse alguma coisa, amor?

— Fédaputa!

Não há mais dúvidas. Ela encosta o carro, desesperada. Estavam a caminho da creche. Atônita, pensa em virar na primeira esquina e voltar para casa. Certamente algum colega malcriado estava desvirtuando seu anjinho. Começa a elaborar – mentalmente – o discurso que fará para a diretora da escola: “não sabia que vocês admitiam gente desqualificada nessa espelunca. Ninguém faz uma triagem prévia? Um levantamento dos valores familiares? Uma…”

— Fédaputa! — interrompe o anjinho.

— Que horror, menino. Onde foi que você ouviu isso?

— Você falou, mamãe.

O desespero transforma-se em culpa e medo. A almejada passagem direto para o Céu está ameaçada. Que tipo de mãe é capaz de praguejar na presença de seu querubim? Tenta se lembrar do momento em que poderia ter dito aquela indecência. Talvez para o corno que tinha lhe dado uma fechada mais cedo. Ou para o merda do atendente da telefonia celular, incapaz de fazer um simples cancelamento. Quem sabe pensando na porra da funcionária que sempre fica doente nas vésperas de feriados.

— Fédaputa! — repete o querubim.

— Que caralho, moleque. Fica quieto um minuto.

As lágrimas agora brotam, denunciando o arrependimento. Ela já consegue sentir o calor das chamas que a aguardam no inferno. Pede desculpas ao filho, entre um soluço e outro. Daqui por diante, sua missão será impedir que seu bebê siga o caminho pecaminoso da mãe.

— Fédaputa! — responde o bebê.

Ela aquiesce. Entende ser merecedora de todos os xingamentos. Mas promete a Deus jamais desistir de seu pequeno.

— Filhinho, isso é muito feio, principalmente na boca de uma criança. Promete pra mamãe que você nunca mais vai repetir isso?

— E só puta, pode? — retruca o pequeno.

Pronto, o garoto também estava condenado. O remorso a corrói por dentro. Chora pelo mal que causara à criança. Ele merecia uma mãe mais zelosa.

— Não, querido, não pode de jeito nenhum.

— E só fé, mamãe?

Puta que pariu, Deus não a abandonara, afinal. O menino tinha salvação. Ela tinha salvação. Foda-se o fogo do inferno. Pau no cu do chifrudo.

— Fé, pode, abençoado. Fé, pode.

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