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Toc, toc, toc, toc…

– Regineide, assim não é possível! O Hardisson não para de bater na nossa porta. Já falei que você tem que distrair o menino enquanto a gente trabalha.
– Mas, dona Shânia, Hardinho tava comigo o tempo todo. Olha ele aqui, com o fone pra não ouvir nada. Tem certeza de que não era a senhora batendo a cabeça na parede de novo?
– Claro que não, Regineide. Bato a cabeça na parede há um tempão, vê se eu ia confundir os sons. Cadê a Annette?
– Tá apagada. Ela sempre dorme quando o seu Bimba começa a gritar. Deve ser o ritmo, né?
– Já te falei mil vezes pra não chamar o Carlão de Bimba. Nome artístico é só do quarto pra dentro.
– Por falar nisso, dona Shânia, será que não tá na hora da senhora e o seu Carlão voltarem a trabalhar num estúdio? Os meninos estão crescendo. Annettinha ainda é quase um bebê mas o Hardinho tá cada vez mais desconfiado que vocês não são dubladores de animes.
– Tá louca, Regineide? Você não sabe que o setor artístico foi o mais afetado nesta pandemia? Cadê a verba? Além do mais, nos desenhos que o Hardinho assiste tem muito mais gritaria.
– Dona Shânia, o menino ouve a barulhada e depois vem me pedir pra contar a história que vocês estão dublando. Já inventei um monte de personagens pra tentar disfarçar. Tem anime Cadete, anime Baqueta, anime Cocota. O anime Pirralho é o que mais aparece na trama.
– Tô gostando de ver.
– Mas ele não é bobo. E minha criatividade tem limite. Isso não vai terminar bem.
– Aqui em casa tudo sempre termina bem. Vamos tentar ser mais contidos, Regineide. Mas é difícil. A arte toma conta da gente quando a câmera começa a gravar.
– Ah, eu sei. Sou eu que tenho que limpar toda aquela arte depois.
– Você não entende nada de cinema. Seu trabalho é continuar enrolando as crianças.
– Quando estão só vocês dois no quarto ainda vai. O duro – desculpe o trocadilho – é quando aparece um monte de gente. Semana passada tava um entra-e-sai danado.
– Regineide, o entra-e-sai ali não vai parar nunca.
– Mas eu não sei o que dizer pro Hardinho.
– Improvisa. Fala que é reunião de condomínio.
– E eu já não disse? Outro dia ele viu uma moça pelada aqui na sala e eu falei que o síndico agora manda tirar a roupa de quem faz barulho. É por isso que agora ele só anda de meia.
– Depois a gente fala sobre isso, Regineide. Tenho que me concentrar pra conseguir voltar pro personagem.
– A senhora é uma ótima atriz, dona Shânia. Fico impressionada com a sua dedicação e a sua entrega.
– Eu sei que poucos nascem com esse dom artístico. Deixa eu ir que o Carlão já tá me gritando.

Toc, toc, toc…

– Olha o barulho aí de novo. Quem será que tá fazendo isso?
– Ah, é o seu Eduardo, vizinho aqui de cima, reclamando. Mas os gritos de vocês só incomodam quando não estão tocando “Evidências” lá em baixo.
– Me avisa se ele bater no piso de novo. Vou abrir uma reclamação no livro do condomínio. Se tem uma coisa que me tira do sério é gente sem noção.

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