Quando ele também foi embora…

São três da manhã do dia vinte de janeiro de 2015. Daqui a poucas horas estarei velando o corpo do ser humano mais iluminado que conheci em toda a minha vida. Uma pessoa tão bondosa que conseguia transmitir, em um mero sorriso, toda a grandeza da sua alma. Quando ele sorria, as pessoas retribuíam naturalmente, sem se darem conta de que aquele simples ato havia marcado para sempre as suas vidas. E ele sorria para todos da mesma forma, com o mesmo carinho e com a mesma espontaneidade. Nunca fez distinção alguma de classe, posição social, hierarquia ou qualquer outra. Seu sorriso sempre foi completo, íntegro, verdadeiro, escancarando a todos a pureza do seu íntimo, a dimensão da sua generosidade, a imensidão do seu caráter. Jamais soube o que é rancor, mesmo para com aqueles que o magoaram de alguma forma. Perdoava a todos com tal naturalidade que não conseguia mais se lembrar do que o havia machucado a princípio. Vivia sempre o momento presente, pois o passado e o futuro jamais lhe pertenceram. Tinha uma doçura tão evidente no olhar que sempre foi chamado pelos netos de “Vovô Doce”. E ele sempre foi mais do que um avô para cada um deles. Foi palavra, foi carinho, foi conselho, foi exemplo.

São três e quinze da manhã e entro nos quartos dos meus filhos. Beijo a face de cada um deles e rogo-lhes em silêncio que jamais se esqueçam do avô que acabam de perder. Coloco a mão de cada um deles junto à minha e me lembro de quando eu – pequeno – colocava a minha mão junto à do meu pai e ele me prometia: “amigos até nossas mãos empatarem”. Fisicamente, nossas mãos empataram e desempataram há muito tempo, e o que deveria ser “apenas” uma amizade eterna se tornou veneração, se tornou idolatria. O que parecia ser um futuro muito distante, se mostrou tão verdadeiro mas, ao mesmo tempo, tão breve. E não poderia ser diferente porque, acima de tudo, breve é a vida. 

De repente percebo que, mesmo depois de tantos anos, não sei se eu realmente cresci ou se foi apenas a minha mão que aumentou de tamanho. Não seria de se esperar que, com o empate das mãos, todas as dúvidas, as angústias e as inseguranças estivessem superadas? Que os medos tivessem dado lugar às certezas? Que, ao colocar a minha mão junto às mãos dos meus filhos, eles também pudessem sentir toda a segurança que a do meu pai me transmitia? Hoje, por mais que eu tenha consciência de como é difícil conseguir atingir tal nível de autoconhecimento, sinto que minha mão ainda está longe de empatar com a do meu pai.

Apenas com a sua mão física eu consegui empatar, pai. A sua mão espiritual é grande demais para ser alcançada. Ou, talvez, a minha capacidade de crescimento tenha limitações que suas mãos jamais conheceram. Mas vou continuar tentando, eu lhe prometo.

São três e meia da manhã e deixo meus filhos dormirem em paz. Venho para a sala e agradeço em prantos a Deus por ter me permitido tantas bênçãos, a começar pela bênção maior de ser filho do homem extraordinário que deixou ontem este plano terreno. Um plano ao qual, na verdade, ele jamais pertenceu. Ele veio com a missão de tentar elevar um pouco o nível de consciência deste nosso mundo. E o fez com tal competência que Deus lhe permitiu continuar por aqui, mesmo muitos anos depois que o seu coração físico não tinha mais condições de sustentar seu próprio corpo.

São quase quatro da manhã e tento agora encontrar palavras que possam definir o que o meu pai significa pra mim. Nada mais impossível, pois não existem em língua alguma palavras que traduzam o amor mais pleno que poderia existir. A proximidade da aurora, entretanto, me traz a imagem daquele primeiro raio de sol que desponta no horizonte. Aquele que aponta o caminho para os demais o seguirem e, dessa forma, inundar a planície de luz. Meu pai sempre foi esse primeiro raio de sol. Foi também todos os demais que inundaram de luz a minha vida. Foi meu Norte, minha bússola, a estrela que me guiava de volta para o cais. Foi meu maior orgulho, meu herói imbatível, meu melhor amigo. Foi meu confidente mesmo quando eu nada lhe dizia, meu conselheiro mesmo quando o assunto não lhe era conhecido, minha referência mesmo quando optava por uma direção alternativa à dele. Foi a maior dádiva e o maior amor da minha vida.

São mais de quatro da manhã e percebo, pela primeira vez, o tamanho do vazio que a sua ausência me causa. Percebo também que, ainda maiores que a minha saudade, são os inúmeros exemplos que ele deixou, as inúmeras palavras de amor e confiança que ele me disse. Percebo que jamais conseguirei agradecer suficientemente por tudo o que ele fez e continuará fazendo por mim e pela família que criei à sua imagem. Percebo que estarei sempre de joelhos a seus pés, tamanha é a minha veneração por este ser de luz pura, de olhar doce, de sorriso aberto que tive a honra inacreditável de chamar de meu pai!

São quase cinco da manhã e o primeiro dia do resto da minha vida está só começando…

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Porque a Natureza não celebra o Ano Novo…

Hoje, mais um ano está chegando ao fim. E com ele, à meia-noite, alteram-se todas as perspectivas. Para o sol, entretanto, este será mais um ciclo diário como qualquer outro. Ele vai se pôr hoje e renascer amanhã, como sempre fez. Não haverá auroras boreais iluminando o céu, nem chuvas de meteoros riscando a noite escura. As estrelas não brilharão nem mais nem menos do que ontem, e a lua cultivará o mesmo silêncio discreto que lhe caracteriza. Aqui na Terra, as ondas do mar chegarão às praias com a mesma intensidade. As montanhas, o mar e as planícies irão limitar hoje os mesmos horizontes. As florestas seguirão emitindo os mesmos sons e abrigando a mesma vida. A própria Natureza se recusa a comemorar a chegada deste dia que, para o homem, é tão significativo.

Para o homem, afinal, a noite de hoje é um recomeço. Hoje, ele tem a oportunidade de iniciar um novo ciclo, uma nova esperança, uma nova vida. Hoje, ele pode dizer que aprendeu muito com os erros do ano que se encerra e que jamais voltará a cometê-los no ano vindouro. Hoje, ele pode finalmente se livrar das mágoas, dos rancores, dos sentimentos de culpa que, como algemas destravadas, o libertarão à meia-noite. Hoje, ele tem a capacidade de perdoar aos outros e a si mesmo. Hoje, ele tem novamente consciência de que os seus objetivos, os seus anseios e os seus sonhos podem e merecem ser renovados. Hoje, finalmente, ele entende que a felicidade nada mais é do que uma escolha que cabe exclusivamente a ele!

Como pode, então, a Natureza considerar a noite de hoje uma outra qualquer? Como pode ignorar toda a vibração e energia que transbordam nesse momento? Como pode tratar com tanta displicência um instante mágico, transcendente, quase etéreo? Se a Natureza é a mais relevante prova da existência divina, não deveria ser ela a primeira a mostrar toda a importância deste dia? Não caberia a ela, como porta voz do Criador, fazer desta data uma celebração ao renascimento de cada ser vivo do planeta? Não estaria em suas mãos a responsabilidade por tornar este dia verdadeiramente único em todos os sentidos?

E a Natureza, incrédula diante de tamanha limitação mas atenta ao questionamento alheio, responde ao homem:

– Olhe para o sol mais pausadamente e verá que ele nunca é, em uma manhã,  exatamente o mesmo que se pôs na noite anterior. Seus raios, seu calor, seu brilho, oscilam poeticamente a cada dia.

– Aprecie de verdade a lua e as estrelas e também verá que a intensidade da luz que emanam não se repete e não se contém. Pequenas diferenças cintilantes são perceptíveis a cada noite.

– Acompanhe o movimento dos oceanos e verá que as correntes marítimas levam, a cada maré, um tipo diferente de vida ao litoral. E, a cada onda, a areia do fundo se acomoda de forma inédita, mudando constantemente a topografia das praias.

– Respire o ar de uma floresta e irá notar que os perfumes mudam com o passar das horas. Também mudam os sons, as texturas e os habitantes que se transformam a cada novo raio de sol. E a cada rajada de vento, uma orquestra diferente nos brinda com sinfonias recém compostas.

– Contemple o encontro entre Terra e céu e verá que um entardecer nunca é igual ao outro. As molduras, as nuvens e as cores dão a cada horizonte nuances jamais vistas. Pássaros de diferentes tonalidades e vozes são as pinceladas finais de cada quadro em movimento.

– Tudo isso acontece porque cada dia é absolutamente único. Não existe nenhum dia igual ao outro para mim, assim como não deveria existir para você, homem.

– Por que esperar um ano inteiro para poder renovar suas esperanças, seus sonhos e seus objetivos? Por que viver durante tanto tempo preso a mágoas e remorsos? Por que não começar do zero a cada dia, com vontade de viver e disposição renovadas? Por que não se perdoar diariamente? Por que esperar meses apenas para se permitir dizer que a vida vale a pena? Por que não aprender imediatamente com cada erro cometido? Por que postergar um segundo que seja a sua decisão de ser feliz? Por que não viver cada dia como se todos fossem o primeiro dia de um novo ano?

– Você não foi capaz de compreender que eu jamais me recusaria a comemorar o evento de hoje. Na verdade, eu me recuso a deixar de celebrar cada dia, cada noite e cada manhã, da forma mais sublime possível: vivendo cada momento em absoluta plenitude!

– Por isso, não desejo a você, homem, um feliz ano novo hoje. Desejo-lhe sim, hoje e todos os dias, um abençoado dia novo! Um dia pleno, bastante em si mesmo, de paz e de profunda harmonia. Esta é a minha única fórmula para viver. E só vivendo, você poderá realmente absorvê-la por inteiro!

– Feliz Dia Novo! Felizes trezentos e sessenta e cinco novos dias neste ano que se inicia!

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Mais um Natal com você…

Hoje a ceia de Natal é por nossa conta, mãe! A mesa está linda, como tudo o que a Dani faz! O Sílvio vai trazer o bacalhau e as rabanadas que ele fez seguindo a sua receita. Vai ter também aquele filé que você sabia preparar como ninguém. Mas não vai ter você! Vai ter cerveja, champanhe e vinho. Vai ter música e crianças correndo e brincando. Mas não vai ter você! Vai ter a árvore enfeitada com bolas, anjos e luzes piscando. Mas não vai ter você! Vai ter o nosso sagrado momento de oração e de agradecimento. Mas não vai ter você! Não vai ter Papai Noel desta vez. E também não vai ter você! Vai ter presente à vontade para todas as crianças. Mas não vai ter você! Vai ter amor e harmonia como sempre. Vai ter saudade como nunca! E não vai ter você!

Mesmo sem você, mãe, esperamos que este também seja um Natal feliz, como todos os outros que passamos juntos. Feliz por ter nosso pai de novo em casa, sendo mais uma vez o nosso maior presente, exatamente como no ano passado. Feliz porque toda a harmonia que você plantou está e sempre estará entre nós. Feliz porque temos o seu exemplo, o seu sorriso e o seu olhar para recordar hoje e a cada dia. Feliz porque temos certeza de que o seu Natal será também cercado de amor, de luz e de serenidade!

Por isso, lhe desejamos hoje um Natal iluminado, mãe. O nosso pensamento, a nossa energia e o nosso amor estão juntos de você nesta noite! Também estão juntas nossas orações, as nossas vibrações e as nossas almas. E assim, mãe, unidos em essência, em espírito, em sintonia e em amor, este vai ser mais um Natal perfeito ao seu lado. Mais um Natal com você!

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Porque é Natal…

Poucas datas comemorativas têm um significado tão amplo quanto o Natal! E não apenas pela mudança de enfoque que assistimos ao longo dos anos, cada vez mais comercial e menos religioso. Mesmo aqueles que fazem do Natal um momento de reflexão, manifestam suas crenças através de abordagens e costumes diversos.

A maioria, até em virtude das crianças, dão ênfase às imagens de Papai Noel e muitas vezes se esquecem do Cristo menino. Outros tantos comemoram o surgimento do filho de Deus através dos dogmas e rituais próprios de cada religião. E para tantas e tantas pessoas, o Natal é sinônimo de confraternização, de harmonia, de festa em família. Pra mim, o Natal é a celebração do nascimento de um homem tão importante e tão revolucionário, que conseguiu ser um divisor de eras. Um homem que soube ensinar amor quando a única saída conhecida era a agressão. Que mostrou que as palavras têm um poder ilimitado, e estas deveriam ser sempre as nossas únicas armas. Que quebrou regras, que se rebelou, que mostrou que devemos lutar pelos nossos objetivos com a mesma serenidade com a qual aceitamos os desígnios divinos. Que conseguiu plantar definitivamente uma mensagem no coração dos homens. Uma mensagem que até hoje é compartilhada através de exemplos extraordinários, muito mais significativos e emblemáticos que as palavras vazias que muitos “diplomados” se contentam em repetir. Gandhi, Madre Teresa, Chico Xavier, Irmã Dulce, Papa Francisco, além de incontáveis outros famosos e anônimos, são todos exemplos de seres iluminados que jamais se conformaram com o sistema em que viviam. Através apenas do amor e das palavras, tiveram a coragem de fazer a sua parte, de contestar, de mostrar que havia outro caminho, e isso fez toda a diferença. Posturas que mudaram o mundo, exatamente como Jesus nos ensinou através de suas atitudes e de suas palavras!

Pois que este Natal seja um momento de reverenciar todos aqueles que seguem realmente a palavra de Jesus. Que seja também, antes de qualquer coisa, um dia de agradecimento. Por mais difícil que tenha sido o ano, por maiores que tenham sido os obstáculos, a nossa vida continua, com todas as suas alegrias e dificuldades, conquistas e desafios. Que possamos entender, portanto, que tudo o que vivenciamos é fonte de crescimento. Que saibamos, cada vez mais, dar valor às pessoas que amamos pois não as teremos ao nosso lado eternamente. Que consigamos compreender e buscar a realização dos nossos sonhos, pois não podemos nos contentar em apenas passar pela vida. Que tenhamos discernimento, entretanto, para saber quando nos comportar como um rio, que contorna seus obstáculos e mantém sua direção rumo ao mar, e quando agir como um vulcão, que rompe camadas de rocha para criar o seu próprio caminho. E que, sendo rios ou vulcões, o façamos com a mesma serenidade, com a mesma humildade e com o mesmo objetivo: seguir a nossa consciência e fazer o que entendemos ser o certo. Enquanto agirmos desta forma, mesmo errando, estaremos honrando o nome de um homem que nasceu há mais de dois mil anos. Um homem que, até hoje, consegue fazer com que bilhões de pessoas se reúnam em torno de um presépio e compreendam, mesmo que por apenas uma noite, que as suas próprias famílias são tão sagradas quanto aquela representada pelas imagens dispostas em uma pequena manjedoura! Enquanto agirmos desta forma, independente das adversidades e agonias de cada momento, teremos sempre um Natal feliz, abençoado e em paz!

Feliz Natal a todos!

 

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Ensaio sobre a morte…

Desde que me entendo por gente busco compreender a minha própria existência. Às vezes essa busca ocorre de uma forma mais ativa, propositalmente inundando minha mente com perguntas que eu não sei responder. Em outras, meu sono se perde em meio a tantas respostas para as quais não fiz nenhum questionamento. Seja qual for o momento em que me encontre, cada vez mais percebo o quão longe estou de qualquer conclusão que me satisfaça. E cada vez fico mais certo de que não a encontrarei tão cedo, mesmo quando agonia e alívio se misturam diante de uma quase resignada impotência. Talvez porque não exista uma única resposta para o que se procura. Talvez porque o que realmente conta seja a busca em si, e não seu capítulo derradeiro. E talvez porque a gente só passe a compreender realmente a vida depois de conhecer e entender a morte.

E não é que, de uma hora para outra, a morte passa a ser companhia frequente? Logo eu que sempre a tratei com cerimônia, jamais lhe dando motivos para que se sentisse muito íntima. Durante muitos e muitos anos meus encontros realmente próximos dela vieram através da minha avó materna e de um garoto lindo que me chamava de Nando. Esses dois primeiros encontros não me fizeram ansiar por outros, mesmo reconhecendo que, em ambos, sua face não tenha me assustado. Apesar de terem deixado os meus em lágrimas, seus olhos escuros não conseguiram esconder o amor que havia por trás daquelas tarefas tão difíceis de serem interpretadas.

Desde então, passei a repetir para mim mesmo, numa tentativa de postergar o inevitável, que meu encontro seguinte com ela estaria ainda longe de acontecer. Pura bobagem, afinal, longe ou perto é só uma questão de ponto de vista. Para mim, por maior que tenha sido o intervalo, foi rápido como o dia que se segue a cada noite. E, de repente, eu percebo que a face dela não mudou. Percebo que seus olhos continuam os mesmos, incapazes de esconder o amor, mas, mesmo assim, tão eficazes em inundar os meus. E foram dois encontros furtivos, daqueles que aparentam ser fora de hora, guiados por dois anjos, um pequenino de olhar doce e cabelos encaracolados, e outro maior, de olhos azuis-turquesa tão lindos que fizeram com que o olhar dela parecesse ainda mais sombrio. Uma vez mais, o tempo não significava nada. Uma vez mais, repeti tolamente que o próximo encontro estaria distante.

Acho que só para me contradizer, até por pirraça, veio – logo em seguida – o primeiro dos encontros para os quais eu sabia que precisava ter me preparado. Ao invés disso, dessa vez eu não queria encarar os olhos dela. Não queria perceber o amor que sabia existir ali. Não queria nada que pudesse justificá-la, humanizá-la, resgatá-la do meu pré conceito de tirana impondo sua força. Mas, mesmo tendo esse encontro ocorrido graças àquela que me acalentava quando muitas das minhas próprias perguntas me tiravam o sono, não consegui evitar o seu olhar. Ainda assim, seus olhos escuros me transmitiram um amor tão grande, que nem mesmo as minhas próprias lágrimas puderam deturpar. Eu estava rendido. Ainda estou…

Hoje, ainda que não anseie por novos encontros, tenho plena consciência de que eles virão, e em um tempo que, independentemente de números, será considerado breve. Mas, por mais que eu saiba que vou sempre encontrar o amor nos olhos dela, temo que o próximo encontro venha a ser o mais doloroso de todos até agora. Sei também que ela, embora ciente do seu tempo, é a única que realmente anseia por esse momento, pois o olhar que vai encontrar é tão límpido, que fará com que seus olhos escuros brilhem como poucas vezes ela mesma tenha experimentado. E eu, do alto da minha completa impotência e conformidade, peço humildemente à Vida que postergue ao máximo esse encontro, pois ainda existem aqui muitos olhares, hoje opacos, que precisam do olhar límpido para poder brilhar novamente, antes de estarem prontos para encarar aqueles olhos escuros, repletos de amor, vistos inevitavelmente através de mais uma cortina de lágrimas.

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O dia que minha mãe se foi…

Um outro texto sobre minha mãe que não poderia ficar de fora deste blog. No dia 03 de outubro deste ano, apenas 45 dias depois de um diagnóstico que pegou a todos nós de surpresa, minha mãe foi dar sequência ao seu caminho em um plano bem mais elevado. Nem os médicos, tampouco nós da família, imaginávamos perdê-la em tão pouco tempo. Mas nos confortou muito saber que, com sua partida tão rápida, a maior parte de seu sofrimento foi abreviada. Mesmo assim, sei que aquele dia será sempre lembrado enquanto eu viver…

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Minha mãe se foi hoje. Por mais que eu estivesse certo da proximidade desse dia, é quase surreal reler minhas próprias palavras: minha mãe se foi hoje. Mas, ainda que a errônea noção de que “era muito cedo” persista, consigo perceber que, além da imensa saudade e da profunda tristeza, destacam-se também uma sensação de total serenidade acompanhada da inevitável constatação de que a vida é muito breve.

Serenidade ao olhar pra trás e não ter do que se arrepender. Não ficaram mágoas ou assuntos mal resolvidos. O amor e a admiração sempre foram deixados muito claros. Os defeitos e as faltas de ambos sempre foram mutuamente perdoados. Nada deixou de ser dito, principalmente os incontáveis “eu te amo” de ambas as partes. Cada encontro sempre foi aproveitado ao máximo e nossos olhares nunca se esquivaram.

Constatação de quanto a vida é breve ao me lembrar nitidamente da morte da minha avó, ocorrida quando eu tinha 13 anos de idade. Na época, minha mãe era mais jovem do que eu sou hoje. E, de repente, eu percebo que 34 anos se passaram como num piscar de olhos. Como? O que foi feito em todo esse tempo? Não, o que foi feito nessa fração de segundo que agora percorre meu olhar? Tanta coisa e tão pouco…

Obrigado, mãe, por tudo. Pelos erros e pelos acertos, pelas dúvidas e pelas certezas, pelo amor incondicional, pelo apoio, pelos conselhos, pelas broncas, pelo carinho mas, principalmente, obrigado por você ter sido, para mim, um dos meus maiores guias na busca do meu próprio caminho. Obrigado por sempre ter me entendido apenas através do meu semblante, mesmo que eu não dissesse nada. Obrigado por ser minha inspiração de força, de coragem, de determinação, de fé, de generosidade e de desprendimento. Obrigado por ter sido um exemplo de avó para os meus filhos e meus sobrinhos, e obrigado, mais uma vez, pela honra e pelo privilégio de ser seu filho. Vou sentir demais a falta do seu abraço, do seu colo, do seu olhar e do seu carinho. Mas vou ficar bem, pode ter certeza, viu? Todos nós vamos ficar bem. Só não vou sentir falta do seu amor porque este estará presente para sempre no meu coração. Amo você hoje e vou continuar te amando eternamente. Vá com Deus e siga o seu caminho de luz com a certeza de que você atingiu, como poucos, o maior objetivo dessa nossa passagem pela Terra: evolução.

Lamento muito não ter sido profético no poema que escrevi para você quando completou seus 70 anos. Mesmo assim, o reproduzo abaixo em sua homenagem. Obrigado mais uma vez por tudo! Eu amo você de uma forma que não dá pra dizer! Só dá pra sentir…pra sempre!

Para Nilda

Escassos são aqueles que no coração carregam
Caráter de tal grandeza que no próprio olhar se sustenta
Que trazem em cada átomo a placidez por saber
Que, ao amar integralmente, se completa, se contenta.
Que fazem de cada instante, de cada passo e de cada história
Uma nova aurora para aquele que a suas palavras atenta
Que crescem constantemente, que evoluem, que se constroem
Que geram a energia vital que o limite da alma representa.

Muito escassos são aqueles que, presos à noite e ao dia,
São pais, são avós, são exemplos que não se inventa
São guias de toda gente, de toda idade e de toda hora
Que fazem com alegria sacrifícios que a maioria não tenta.

Muito raros são aqueles que, como você, mãe, senhora,
Chegam com tanta energia à metade da vida, aos setenta.
E, se achar exagero a “metade”, dita com tanta prosa,
Há de nos escutar em um tempo buscando rimar com noventa.

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Aos meus pais…

Como eu disse no primeiro texto deste blog, sempre fiz questão de escrever para os meus familiares e amigos, nos seus aniversários e celebrações. Com meus pais, entretanto, a leitura desses cartões cumpria quase que um ritual. Mas, por mais que eles realmente esperassem ler uma nova declaração de amor a cada data marcante, jamais escrevi uma mensagem com displicência, apenas para atender a uma expectativa deles. Foram dezenas e dezenas de textos e poesias escritos sempre com profunda emoção, com um sentimento de gratidão sem medida e com uma certeza de que tudo o que eu viesse a falar ainda seria pouco para homenageá-los.

Em meados de agosto deste ano, minha mãe foi diagnosticada com uma grave enfermidade. Como a saúde do meu pai sempre inspirou muitos cuidados, eu sabia que não teria mais tantas oportunidades de me declarar diretamente a eles, pelo menos através dos meus textos. Por isso escrevi, no início de setembro, a mensagem que se segue. Mensagem esta que jamais foi lida pela minha mãe. Entretanto, foi declamada para ela, Deus sabe como, ao lado de uma cama de hospital, poucos dias antes de vê-la consciente pela última vez! Neste blog, tão íntimo e pessoal, não poderia faltar uma homenagem que pretendia ser emotiva e motivadora, mas acabou se tornando a derradeira!

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AOS MEUS PAIS

A cada Dia das Mães, a cada Dia dos Pais, a cada aniversário de casamento e a cada aniversário individual de cada um de vocês, sempre procurei escrever, em meu nome e em nome dos meus irmãos, um cartão tentando lhes dizer um pouquinho do quanto vocês significam pra gente. Embora tenha sido sempre verdadeiro nas minhas mensagens, com o passar dos anos, quase que inconscientemente, passei a monitorar as palavras que escrevia, pra que vocês não se emocionassem demais. Hoje, naturalmente, sei que restam não muitas mensagens a serem escritas daqui pra frente. Espero que eu escreva ainda muito mais do que eu imagine, muito mais do que vocês mesmos esperam receber. De qualquer forma, não consigo resistir ao impulso de escrever sem limitações, sem reservas, sem auto censura. Por mais que vocês saibam de absolutamente tudo o que vai ser posto aqui, acho que é sempre muito bom poder constatar o quanto as suas próprias atitudes conseguiram marcar, de maneira tão absurdamente definitiva, os caminhos de tantas pessoas.

Vocês dois são, com certeza, as maiores bênçãos que nós poderíamos ter recebido em nossas vidas! Vocês conseguiram formar uma família absolutamente harmoniosa, tolerante, amorosa, feliz e consciente do papel que essa harmonia representa na vida de cada um. Tanto é assim, que as famílias que nasceram de cada um de nós, conseguem manter a mesma harmonia, a mesma serenidade, o mesmo amor e a mesma consciência. Mas vocês fizeram muito mais do que isso. Vocês conseguiram, da mesma forma, tocar os corações de todos aqueles que se aproximaram de vocês. Quem chega perto de vocês, se aconchega e fica. É como ter um cobertor quente numa noite fria de inverno. O calor vem das suas palavras sempre sensatas, carinhosas e extremamente evoluídas, pai! Vem também da sua natural e imensa disponibilidade em ajudar, mãe! Vem do olhar, do sorriso, da alegria e da generosidade de vocês dois! Eu aprendi, com vocês, que o importante na vida é que a gente consiga tocar verdadeiramente o maior número de corações possíveis. Seja os da sua própria família, dos amigos, dos colegas de trabalho, e até daqueles com quem podemos nos deparar apenas uma vez. Vocês fazem e fizeram isso naturalmente ao longo das suas vidas. Já os nossos corações, os corações dos seus filhos, noras e netos, foram mais do que simplesmente tocados. Eles foram e são ungidos diariamente pelo seu amor e suas bênçãos. E não existem palavras que possam expressar a nossa gratidão a Deus por nos ter permitido tamanha honra, tamanha oportunidade, tamanho privilégio. Termos vocês como pais, nos dá a certeza de que temos ainda muito a fazer com as nossas próprias existências. Temos que buscar ser sempre os melhores amigos, os melhores pais, os melhores esposos, os melhores patrões, os melhores funcionários, enfim, os melhores seres humanos. Temos que levar alegria, tolerância e serenidade a todos à nossa volta. Temos que procurar ser essencialmente bons, na mais ampla e nobre essência da palavra. Apenas uma missão como essa justificaria termos recebido os melhores guias e os melhores instrutores. Vocês são a razão maior da felicidade que sempre existiu nas nossas vidas. Vocês são também o exemplo maior de que estamos neste mundo para crescer e evoluir não apenas como pessoas, mas primordialmente como almas!

São tantos os momentos inesquecíveis que passamos juntos, que seria impossível descrevê-los um a um. Mas tenham certeza de que cada um deles está marcado para sempre no meu espírito, meus queridos!

Ao seu lado, pai, eu me lembro vividamente da minha segunda viagem de avião, e você fingindo estar se divertindo com cada raio que cortava os céus, cada rajada de vento que fazia a aeronave dançar como se uma pipa fosse, cada queda brusca de altitude naquela tempestade tão terrível que quase interrompe nossa jornada prematuramente. Você sofria só por dentro e eu, pequeno, me divertia pela sua atitude, pela sua confiança. E depois me perguntam porque eu sou sempre tão otimista! Eu me lembro também da primeira vez em que percebi o quanto as outras pessoas também o admiravam. Após um discurso que você fez em uma reunião do Rotary, alguém se aproximou e me disse uma frase que me acostumei a ouvir ao longo de toda a minha vida: “o seu pai é um cara muito especial!” E eu, então com não mais do que dez anos de idade, pensei: “eu sei!” Lembro-me das nossas partidas de peteca na AEF. Mais tarde, perdi as contas das vezes que me emocionei com suas palavras, ditas em Natais, Reveillons, festas, celebrações ou, na maioria das vezes, em conversas corriqueiras do dia a dia. Mais recentemente, não me esqueço do nosso jantar com a Dani, só nós três no Sakê, quando você e eu nos abrimos tanto! Lembro-me de absolutamente todas as nossas refeições na Europa, principalmente daquele jantar na Piazzale Michelangelo em Florença. De cada momento do nosso passeio pelo Lago di Como! Lembro-me das diversas apreensões que senti com os seus infartos, suas internações, do imenso medo de te perder! E todos esses momentos foram vividos com a plena consciência de que eu estava desfrutando da companhia, simplesmente, da melhor pessoa deste mundo! E é sempre assim que eu ainda me sinto a todo momento em que estou ao seu lado.

Com você, mãe, eu me lembro dos cursos que fizemos juntos e das possibilidades de crescimento que você abriu pra você mesma e das quais eu fiz parte. Lembro-me do seu carinho e dos seus cuidados sempre que eu estava com febre. Lembro-me da minha volta da Disney aos oito anos de idade e do nosso reencontro emocionado no aeroporto. Lembro-me de você gritando meu nome no Reveillon em Ouro Preto, só porque eu havia lhe pedido que o fizesse, na carta que disfarçava minha volta surpresa de Londres. Lembro-me da sua força e da sua energia sempre que qualquer dificuldade surgia. Lembro-me da sua absoluta disponibilidade em ajudar a todos que necessitassem, a qualquer momento, por que motivo fosse. Lembro-me da sua fé, das suas orações, que sempre me passaram a certeza de que uma proteção divina realmente existe e sempre está presente nas nossas vidas!

Com vocês dois juntos, lembro-me da minha colação de grau e da alegria por vê-los tão felizes e orgulhosos. Os mesmos semblantes eu vi no meu casamento, e no casamento e na formatura de cada um dos meus irmãos. Lembro-me de todas as nossas viagens e de todos os fins de semana no Canto. Lembro-me do nascimento dos meus filhos, dos meus sobrinhos, e da alegria e da emoção que sentiram a cada vez que se tornaram avós. E hoje é indescritível poder testemunhar a completa veneração que cada neto tem em relação a vocês!

Cada um destes momentos, cada instante que passamos juntos, ajudaram a formar a pessoa que eu sou hoje! E a única coisa que eu realmente espero um dia, é que meus filhos tenham por mim, pelo menos, um décimo do orgulho, da admiração, da idolatria e do amor que eu sinto por vocês! Como eu disse, não existem palavras que possam expressar a minha gratidão por ter vocês na minha vida. Que Deus permita que vários novos momentos como esses possam acontecer, novas lições possam ser ensinadas e aprendidas, novos corações possam ser tocados e novas pessoas possam também sentir o calor que vem da alma iluminada que cada um de vocês possui! Obrigado por todos os momentos, pelos sorrisos e pelas lágrimas, pelas conquistas e pelas adversidades, pelos medos e pelas superações, pelos muitos bens materiais, mas principalmente pelas incontáveis lições de vida, essas sim de valor inestimável! Vocês têm feito uma jornada extraordinária até agora! Que ela continue até o momento que o nosso Pai maior entenda ser o adequado. Cabe a nós apenas torcer para que este momento demore ainda muito, pois o mundo é, sem a menor sombra de dúvida, um lugar muito melhor com a presença de vocês! Cabe também a nós ajudá-los a viver intensamente cada novo momento. Viver com alegria, com entusiasmo, com gratidão e com disposição, fazendo de cada dia uma verdadeira celebração às suas próprias vidas! Isso é o mínimo que vocês merecem! Isso é o mínimo, tenho certeza, que o Universo, por gratidão, vai conspirar para que vocês alcancem!

Eu amo vocês de uma forma que não dá pra dizer! Só dá pra sentir!

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Lembranças da minha avó…

Embora escreva desde muito novo, muitos textos se perderam ao longo dos anos, escritos em cadernos escolares ou em pedaços de papel que não mais existem. Entretanto, há pouco mais de um ano, ao encaixotar documentos para a minha mudança, me deparei com uma pequena coletânea de poemas e textos escritos durante a minha infância e adolescência. Não vou transcrever todos aqui, mesmo porque, a grande maioria deles representa a inocente visão de mundo que aquele garoto tinha na época. Gostaria apenas que dois deles se tornassem públicos, e por razões semelhantes.

O primeiro por descrever meu sentimento em relação à passagem daquela que contribuiu imensamente para a felicidade da minha infância e para a minha formação pessoal e emocional de um modo mais amplo: minha avó materna, cuja morte representou a minha primeira grande perda.

O segundo, por exemplificar de forma clara quais foram os valores que essa mulher extraordinária conseguiu transmitir para mim e para os meus irmãos, enquanto tivemos o privilégio do seu convívio.

Ela nos deixou quando eu tinha quase 14 anos de idade e, no ano seguinte, escrevi o seguinte acróstico:

AMOR VIVO

A dor angustiante da saudade

Vem forte, de repente, sem piedade

Outra vez machucar meu coração.

 

Antiga melodia revivida

Momento tão marcante desta vida

Imagem transmitida pelo tempo

Gota de memória em meu lamento

Amor vivo, saudade e solidão.

 

Mas o contraste forte de um olhar

Unificando a lágrima a rolar

Lança no espaço uma certeza

Herança que ressurge da tristeza.

Então me envolve estranho sentimento

Raro instante de conhecimento.

 

Alento baseado na coragem

Miragem momentânea da passagem

Instante de lição comprometida

Graças pelo amor da despedida

Alma pura, verdade e emoção.

 

Memórias de um passado tão presente

Ainda alimentam minha mente

Embalando a dor de uma paixão.

 

Poucos anos depois, quando tinha por volta de 17 anos, escrevi o texto a seguir. Ambos os textos estão sendo reproduzidos neste blog para que possam, não apenas homenagear uma mulher de fibra, de coragem, de caráter e de determinação impressionantes, mas também celebrar a importância do seu amor nos meus próprios interesse e motivação para começar a escrever. Por tudo isso, obrigado minha querida e saudosa Vó Bili!

REAL ILUSÃO

Ingenuamente, me ensinaram a ser malicioso. Lição primordial de quem quer vencer.

Puramente, me disseram que eu fosse viril. Pra que todos soubessem que eu era, antes de tudo, um homem.

Serenamente, me previniram do mundo brutal. Para que eu estivesse preparado para a vida.

Confiaram-me também um grande segredo: que eu tivesse atenção e suspeitasse de todas as pessoas à minha volta.

Calmamente, me falaram da disputa diária pela vida. Desta prova pela qual eu teria que passar.

Tranquilamente, me alertaram sobre a violência. O caminho seria sempre responder na mesma moeda.

Sabiamente, me mostraram as distorções da sociedade. Distorções às quais eu teria que me adaptar.

Infantilmente, me explicaram o que é a realidade. Disseram que o sonho e a fantasia não teriam lugar no meu mundo.

E, sem preconceitos, me ensinaram a rotular as pessoas. Aprendi as regras e os nomes que eu deveria seguir.

E lá fui eu pela vida afora, certo de estar bem preparado para ela. Consegui ter tudo o que eu queria, não importando se, para isso, passei ou não por cima de alguém. Mas, por mais que eu imaginasse ter tudo, alguma coisa sempre parecia me faltar. E essa busca continuou durante toda a minha vida…

Mas ela finalmente terminou. Um dia ela teria que terminar. Eu demorei uma vida inteira para conseguir encontrar algo que eu já havia possuído uma vez. E agora eu vejo as coisas claramente. Sei porque eu perdi algo tão simples mas, ao mesmo tempo, tão difícil de ser encontrado.

Foi porque, entre todas as coisas que me ensinaram, se esqueceram de dizer que eu fosse também puro e ingênuo. Calmo, sereno, tranquilo. Que eu confiasse nas pessoas e que não deixasse de lutar pelas coisas nas quais eu acreditasse. Que eu fosse infantil. Que eu nunca deixasse de sonhar. Que a fantasia sempre tivesse lugar no meu coração. E que eu aceitasse as pessoas do jeito que cada um é.

Apenas por isso, eu passei a minha vida inteira procurando por mim mesmo.

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Meus motivos para escrever…

Sempre gostei de escrever. Desde pequeno, era esse um dos meus maiores prazeres. Antes da existência dos correios eletrônicos e das redes sociais, gostava particularmente de escrever e enviar cartas. Cartas que, frequentemente, chegavam aos seus destinos quando as palavras nelas impressas já não continham novidade alguma. E era gratificante perceber que, mesmo assim, elas funcionavam como uma pequena máquina do tempo. Ainda que os fatos já fossem conhecidos, a emoção colocada em cada palavra no momento em que as escrevi só era recebida e, portanto, finalmente compartilhada, algum tempo depois. Por alguns instantes, o tempo era outro para quem lia o que fora escrito. Hoje, as palavras têm efeito imediato e cheguei a pensar que aquela máquina do tempo não conseguiria mais transportar o eventual leitor a um momento distante do tempo das palavras.

Com o fim das cartas, durante muito tempo concentrei meu passatempo nos cartões que sempre fiz questão de escrever para os meus pais, meus irmãos, minha esposa e meus amigos. Por anos a fio, cada aniversário, cada data marcante, cada momento de celebração ficaram registrados nas palavras que eu colocava no papel, quase sempre de agradecimento pelo privilégio do convívio com cada um deles.

Há dois anos, por pura insistência de amigos, abri minha página no Facebook. Ao longo de todo o primeiro ano, minhas incursões por aquela rede social se limitaram a curtir alguns posts e a cumprimentar amigos pelos seus aniversários. Entretanto, de um ano para cá e, especialmente, nos últimos seis meses, comecei a enxergar no Facebook uma chance de reativar meu interesse em escrever. Tudo começou de forma tímida, com uma crítica política específica, uma observação comportamental e, de repente, eu já não conseguia mais conter o meu impulso de escrever sobre os mais diversos tópicos, com apenas uma coisa em comum a todos eles: eram assuntos que me inspiravam, me motivavam ou me emocionavam de alguma forma. Tiveram papéis de destaque, neste período, a Copa do Mundo, as eleições presidenciais e o cenário político-econômico brasileiro. Entretanto, há exatos quatro meses, minha mãe foi diagnosticada com uma doença terminal que a levaria definitivamente menos de dois meses depois. Alguns dos meus textos, a partir de então, foram dedicados a ela e também ao meu pai, cuja saúde requer cuidados ainda hoje. Meu pai – cuja capacidade de escrever com maestria e emoção, entre inúmeras outras coisas – me inspirou ao longo de toda a minha vida.

Diante de tudo isso, comecei a perceber que eu escrevia não mais por hobby, por passatempo ou por diversão. Escrevia porque essa era a única forma de me manter sóbrio dentro do turbilhão no qual eu estava vivendo. Escrevia porque passei a sentir verdadeira necessidade de externar meus sentimentos, minhas emoções, meus pontos de vista. Escrevia porque senti que as minhas palavras encontraram eco nos corações de muitas pessoas, às quais agradeço profundamente. Escrevia, enfim, porque percebi que, dessa forma, estava novamente ativa a minha pequena máquina do tempo que julgara há muito obsoleta.

E é exatamente em função desse somatório de fatores que nasce hoje este blog. Como coloquei no prefácio, um blog sem nenhum tipo de pretensão a não ser escrever inadvertidamente sobre todo e qualquer assunto que desperte a minha emoção. Ele poderá ser denso ou ingênuo, sóbrio ou despojado, suave ou tristonho. Apenas não tenho a menor intenção de torná-lo ordinário, desinteressante ou tolo e, para isso, peço de antemão ajuda daqueles que se dispuserem a lê-lo. Ele poderá conter dicas de viagens, relatos de experiências vivenciadas, textos antigos ou simples mensagens de amor a pessoas próximas. Será, portanto, uma forma de externar um pouco do que sou e do que penso. Será também, tenho certeza, uma forma de autoconhecimento, um divã sem analista, um espelho sem disfarces para a minha própria autocrítica. Espero que o eventual leitor que quiser me acompanhar nesta nova jornada (ou em partes dela), possa também se inspirar de alguma forma, e também me ajudar a fazer deste novo desafio uma fonte de reflexão, de motivação e de crescimento para todos!

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