Renascimentos…

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“Mas o anjo disse às mulheres: não temais vós; porque sei que procurais a Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui, porque ressuscitou, como disse; vinde e vede o lugar onde ele jazia.”

O mundo cristão comemora hoje a ressurreição do Filho de Deus. Fiéis põem-se de joelhos diante da imagem de um sepulcro vazio. Romarias alastram-se por igrejas e templos, tomam ruas de cidades e vilarejos, deixam comovidos os olhares devotos em janelas e sacadas. Palavras de fé e tolerância são compartilhadas em torno das mesas, e multiplicam-se nas telas das redes sociais. Dois milênios depois, muitos ainda buscam um Jesus que os guie e abençoe. O que esperam desse Cristo que hoje renasce? Indulto ou condescendência? Conselhos ou pretextos? Direção ou concordância? Quais deles estão realmente dispostos a ouvir e a entender a mensagem de Jesus, ou apenas procuram distorcê-la para justificar suas atitudes e preconceitos? Que princípios buscam os homens?

Em nome de Deus, pessoas são exploradas diariamente, injustiças aterradoras são praticadas, crimes inomináveis são cometidos. Em nome de Deus, mentirosos contumazes juram propagar verdades, céticos tornam-se autores dos mais complexos dogmas, hereges travestem-se de arautos da fé, cafajestes apresentam-se como porteiros do Céu. Deus é o mais lucrativo de todos os mistérios.

Se Cristo realmente ressuscitou, que hoje renasça também a verdade. Que os homens encontrem a humildade, o bom senso, a capacidade de se colocar no lugar do outro. Que as palavras de Jesus, sempre despidas de empáfia e arrogância, jamais sejam usadas como incentivo à intolerância, ao conflito. Afinal, Ele foi mensageiro do perdão, não do cancelamento de CPF’s. Sua voz ergueu-se em defesa da justiça, jamais da tortura. Suas armas sempre foram o diálogo e o amor, nunca o “ódio do bem”.

Que o Jesus que ressuscita hoje não venha a saber quantos de seus discípulos entendem que um tapa pode ser a melhor resposta para um insulto, que uma invasão sanguinária pode ser mera consequência do comportamento dos invadidos, que as autocracias podem ser justificadas e até aplaudidas. Que o Jesus que ressuscita hoje tenha especial compaixão pelos povos, sempre à mercê dos ególatras, dos déspotas, dos larápios, daqueles que insistem em usar Deus como disfarce para sua própria tirania. Que o Jesus que ressuscita hoje nos traga um pouco de discernimento, e com este, quem sabe, uma réstia de esperança.

“Ide depressa dizer a seus discípulos que ele ressuscitou dos mortos, e vai adiante de vós para a Galiléia; ali o vereis. Eis que eu vo-lo tenho dito.” (Mateus 28:5-7)

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Bocas abertas…

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Lembram-se daquela expressão “quem fala demais dá bom dia a cavalo”? Pois é, os dois candidatos à presidência que lideram todas as pesquisas de intenção de voto têm mais este ponto em comum: ambos precisam ser lembrados de manter suas bocas fechadas. A falta de noção é tamanha que, de quando em quando, até os aliados mais próximos – também conhecidos como “baba-ovos de bandido em busca de uma boquinha” – vencem o pânico de desagradar ao chefe (ou deus, ou mito, como queiram). Consigo visualizar as mãos suadas, os nós nas gargantas, o pavor de serem escorraçados, excomungados, condenados a voltar ao ostracismo habitual que tanto temem. Quase chego a ter pena dos olhares indecisos, das vozes trêmulas proferindo frases entrecortadas e hesitantes.

“Sabe, chefe” – ou deus, ou mito, como queiram – “todo mundo de bom senso sabe que as vacinas não funcionam, que morrer faz parte da vida, que as urnas eletrônicas são manipuladas, que Putin é um conservador, que o golp… perdão… que a revolução de 64 salvou o Brasil do comunismo, que esquerdista merece ser torturado mesmo, e que ninguém devia ter medo de uma cobrinha. Mas tem gente desinformada e ignorante que não quer votar no senhor exatamente por essa sua, digamos, clarividência. Desculpe a intromissão, mas o que o senhor acha de… talvez… quem sabe… tentar evitar esses assuntos mais polêmicos até outubro? Claro, só se considerar que é uma boa ideia. Qualquer coisa tô ali no fundo assistindo aos vídeos do Gabriel Monteiro, tá?”

“Sabe, chefe” – ou deus, ou mito, como queiram – “todo mundo de bom senso sabe que Ortega, Maduro e Putin são democratas, que a pobreza de Cuba é culpa dos embargos, que Marighella é um herói nacional, que a classe média brasileira é podre e adora ostentar, que o povo tinha que acampar na frente da casa de todo deputado golpista, que imprensa tem que ser regulada mesmo, que a Petrobrás nunca foi tão bem administrada quanto no seu governo, e que a solução pra toda guerra é a bebida. Mas tem gente desinformada e ignorante que não quer votar no senhor exatamente por essa sua, digamos, mente humilde e privilegiada. Desculpe a intromissão, mas o que o senhor acha de… talvez… quem sabe… tentar evitar esses assuntos mais polêmicos até outubro? Claro, só se considerar que é uma boa ideia. Qualquer coisa tô ali no fundo lendo o livro da Márcia Tiburi, tá?”

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Concorrência desleal…

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Na agência de empregos…

– Pode entrar o próxim… ah, não. Você de novo?

– Fazer o quê, né?

– O que você tem que fazer é continuar trabalhando. Já perdi as contas de quantos empregos diferentes eu te arrumei. O que houve desta vez?

– A concorrência tá pesada demais. Sempre acaba aparecendo alguém mais especializado.

– Se você não se qualificar vai ficar pra trás mesmo.

– Tem alguma vaga nova aí pra mim?

– Sua sorte é que não faltam ofertas no seu ramo. Quem dera todos os setores aqui da agência tivessem a mesma demanda. Mas você tem que se esforçar bem mais.

– Prometo. Faço qualquer coisa.

– Bom, tem vaga aqui pra apagador de tuítes comprometedores.

– Tava trabalhando com isso semana passada, lembra? Mas aí apareceu o pessoal do PT sumindo com tudo quanto era crítica contra o Alckmin. Meu chefe viu aquela eficiência toda e me mandou embora.

– É, não dá pra competir com eles mesmo. Temos também vagas pra contemporizador de regimes autocráticos.

– Como é que eu vou fazer frente ao Lula elogiando ditador de Cuba e Nicarágua, e a Bolsonaro saudando o regime militar?

– Bem lembrado. Que tal ser intermediador de pedidos a secretários e ministros? Dá uma boa grana.

– Será que os pastores vão deixar?

– Puxa, esqueci que a concorrência ali é desleal. Hum, deixe-me ver… você tem alguma experiência como apagador de provas de atos ilícitos?

– Sério? Com o STF por aí?

– Cara, não tinha notado como o nível do mercado anda alto.

– Tá vendo? Não é culpa minha.

– Exagerador de dados positivos?

– Jamais conseguiria chegar aos pés da turma da Jovem Pan.

– Eliminador (no bom sentido, claro) de figuras históricas indesejáveis.

– Tipo como o PT faz com a Dilma?

– Tipo… pode esquecer, então. Camuflador de incoerências?

– Sabe que eu era bom nisso? Mas veio a guerra e esquerda e direita estão conseguindo justificar até a invasão russa. Fiquei sem mercado.

– Olha, só me resta aqui o posto de adorador de político mesmo. Mas o salário não é dos melhores.

– Ainda tem vaga? Achei que todas estivessem preenchidas.

– No Brasil? Sempre tem. E dos dois lados. Pode escolher o que você mais se identifica.

– Tenho preferência não. Algum oferece benefício extra?

– Bem, um dos lados costuma servir um pãozinho com mortadela de vez em quando.

– E se eu for pro outro?

– Vai ter passeio de moto toda semana.

– Beleza. O que eu preciso fazer agora?

– Pode começar tapando o nariz…

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20 de março…

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Hoje é 20 de março e o verão – que não é bobo nem nada – recolhe-se diante de um calor com o qual não é capaz de concorrer. Caberá ao outono a tarefa de tentar amenizar o ardor que invade o dia. Brisas leves, manhãs frias e noites amenas são as armas de sempre. É o que lhe resta a cada ano. O ímpeto do lume que desperta com o sol, entretanto, não se abala. Trata-se de uma competição desleal, eu bem sei. Tentei igualá-lo, tempos atrás, quando ainda acreditava que me deixar aquecer era sinal de covardia. Tolo, jamais fui páreo sequer para seu brilho. Tomei-o, então, como farol, e os caminhos à minha frente tornaram-se bem mais nítidos.

Hoje é 20 de março e, outra vez, o mais justo dos sóis vem me despertar. É o sol de equinócio, que – assim como ela – espalha sua luz uniformemente, sem privilégios. O privilégio está em saber reconhecê-lo, em aceitar seu fulgor, em perceber as faíscas que insistem em cintilar naquele sorriso, em entender a força da claridade que emana daquele olhar.

Hoje é 20 de março e, assim como todos os dias, eu me espanto diante das centelhas que me vêm em forma de sagacidade, de doçura, de sensatez, de bondade, de senso de justiça, de carinho, de sedução. Não há fagulhas de arrogância, nem coriscos de soberba. Há, simplesmente, a luz.

Hoje é 20 de março e, como sempre, não encontro palavras que façam justiça à estrela que me guia pela vida afora. Por isso – assim como o verão – acabo delegando ao outono a desafiadora tarefa. Afinal, os piscianos costumam ser mais hábeis nos estudos do léxico. Cabe a mim abrir o vinho, servi-lo, e brindar com ela. Brindar à ela: a maior das minhas muitas bênçãos. Que as noites amenas e as brisas leves continuem a nos envolver por muitos e muitos anos. Garanto que a safra do amor é das melhores…

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Filme repetido…

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– Netflix, boa tarde.

– Boa tarde é o cacete. Quero falar com o dono disso daí.

– O senhor ligou para o atendimento ao cliente. Posso ajudá-lo de alguma forma?

– Pode. É só tirar do ar o filme daquele comunista que quer que toda criança vire gay.

– Com quem estou falando?

– Não interessa, talquei? Só falo meu nome pro dono. Depois a imprensa vai me acusar de interferência e outras babaquices.

– Senhor, eu não tenho como transferi-lo para a diretoria e muito menos como alterar a nossa grade de programação.

– Pois fique sabendo que eu vou mandar prender todo mundo aí por atentado ao pudor, talquei?

– O máximo que eu posso fazer é abrir uma reclamação. O senhor se refere a algum filme em particular?

– Sim, mas não sei o nome. Recebi a cena pelo Telegram. Se dependesse da imprensa não ficava sabendo de nada. É aquele que tem uma cena de masturbação.

– Beleza Americana? Cisne Negro? Nove e Meia Semanas de Amor?

– Lembro bem desse último aí. Bati umas boas pun… bom, deixa pra lá. Não é nenhum desses, o filme que eu tô falando tem masturbação de adolescentes.

– American Pie? A Lagoa Azul?

– Nada disso. É um filme com cenas de pedofilia explícita.

– A Caça? O Silêncio? Uno? Os Intrusos? O Príncipe das Marés?

– Tô vendo que vocês só exibem pouca vergonha. É por isso que a família brasileira tá acabando. Mas eu não vou deixar, pode anotar.

– A única coisa que eu quero anotar é a sua reclamação, senhor. Vai prosseguir ou não?

– … ô zero dois? Quem são aqueles vagabundos do filme? Porchat e Gentili? Também, com uns nomes boiolas desses…

– Senhor? Acho que já sei de qual filme o senhor está falando. Vai concluir a reclamação?

– Não. Vou é mandar proibir de uma vez. E, no tocante aos filmes que você me disse, vou exigir que meu pessoal assista a todos. Menos o das nove e meia semanas que eu mesmo assisto.

– Acho pouco provável que o senhor consiga uma censura descarada dessas em pleno século XXI.

– Menina, você anda vendo muita indecência. Vou te indicar uns filmes da década de 60. Grandes dias aqueles. O bom é que a gente nunca sabe quando eles estarão de volta…

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Pódio da vida…

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A etapa da Copa do Mundo de Ginástica Artística, realizada ontem no Catar, foi palco de mais uma disputa entre Rússia e Ucrânia. Nas barras paralelas, o lugar mais alto do pódio coube ao ucraniano. O russo teve que se contentar com o bronze.

Naquela competição, de nada adiantaram os tanques e as tropas que destroem uma nação soberana. De nada valeram as bombas que – no mesmo instante em que a disputa acontecia – matavam uma mãe e duas crianças que buscavam fugir de sua própria cidade, injustificadamente atacada. De nada serviram as atrocidades de um psicopata decidido a se impor a qualquer custo. Não pela sua própria força, fraco que é. Não pela sua própria liderança, inapta em lidar com o contraditório. Não pela sua própria coragem, farsa forjada por um arsenal bélico que teima em esconder uma face medíocre e covarde.

Naquelas barras paralelas, o embate aconteceu entre dois seres humanos, armados apenas de seus corpos e habilidades. Venceu o melhor. No pódio, o ucraniano ergueu sua medalha, e foi merecidamente ovacionado. Derrotado, o russo ostentou – com orgulho – o símbolo da guerra em seu peito. A letra “Z”, referência à expressão “za pobedu” (para a vitória), tem sido pintada em diversos veículos blindados que invadem e destroem o país do medalhista de ouro. Para o jovem ginasta russo, o “Z” que mina esperanças, que mata inocentes, que coloca em risco a paz mundial vale mais do que o bronze conquistado sem o auxílio dos mísseis lançados pelo exército de seu país.

Tolo ginasta russo, incapaz de compreender que sua verdadeira derrota não acontecera na disputa das barras paralelas. Ele foi vencido ali – no pódio -, ao revelar ao mundo sua subserviência, sua fraqueza de caráter, sua insignificância.

Tolo Vladimir Putin, incapaz de perceber que, mesmo que seus tanques e suas tropas conquistem a Ucrânia, esta é uma guerra que a Rússia já perdeu.

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Novos tempos…

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Março de 2018. Militantes e organizadores de campanha debatem sobre o grau de comprometimento a ser exigido dos novos voluntários. Mesmo animados diante das enormes filas que se formam em frente aos comitês a cada dia, todos sabem que os meses seguintes irão exigir perseverança, disposição e lealdade inabaláveis. O processo de seleção, portanto, deve ser dos mais rigorosos. Buscam-se soldados, não meros simpatizantes. Soldados dispostos a obedecer, sem questionamento, as orientações de seus superiores. Não basta, por exemplo, que os postulantes estejam fartos da incompetência, do aparelhamento, dos assaltos aos cofres públicos verificados nas gestões anteriores. Intolerância e ódio irrestritos são fundamentais para que a empreitada seja vitoriosa.

Depois de muita discussão, decidem começar a triagem pela análise das redes sociais. Quem não compartilha memes chamando Dilma de anta, Lula de molusco cachaceiro, petista de câncer do país, e artista de esquerda caviar é sumariamente descartado. A ausência de fotos em passeatas a favor do impeachment também é pretexto para indeferimento imediato.

A prova seguinte é o culto ao heroísmo. O objetivo é identificar aqueles que só se satisfazem com um salvador da pátria. Um ser onipotente, onipresente e onisciente que, quando parece ter errado, está apenas se antecipando aos problemas que só ele é capaz de enxergar. Odes saudosistas ao período da ditad… da intervenção militar contam pontos preciosos.

Na última etapa da triagem, os interessados respondem a um pequeno questionário para que se possa confirmar a orientação ideológica de cada um. São perguntas de múltipla escolha, básicas, quase protocolares:
“A qual grande inimigo um governo honesto e conservador deverá estar atento? O corrupto Centrão ou o incorruptível exército?”
“Com qual país o Brasil deve buscar estabelecer alinhamentos profícuos e duradouros? Estados Unidos ou Rússia?”
“Qual é o verdadeiro objetivo do bolsa-família nos governos do PT? Assistência aos mais carentes ou compra descarada de votos?”
“O que se espera de um governo de direita no campo da economia? Responsabilidade fiscal, controle de gastos, reformas estruturantes e privatizações, ou gastança desenfreada, criação de estatais, e aumento da dívida pública?”
“Quem é o responsável pela maior operação anticorrupção da história do país? Sérgio Moro ou Dias Toffoli?”
“Inflação sob controle, juros baixos e crescimento sustentável são atribuições de qual esfera governamental? Executivo federal ou governadores e prefeitos?”

Aprovados, milhares de voluntários juntam-se à causa. Forma-se, assim, um exército leal e de muitas alcunhas.

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Março de 2022. A tropa perdeu muitos de seus membros, mas ainda é numerosa. A captação de novos integrantes continua. Não há mais filas, tampouco grandes exigências na triagem dos poucos interessados. Apenas o questionário permanece… mas o gabarito foi alterado.

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Uma história hipotética…

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Um dia, o exército de um hipotético grande país europeu invadiu um de seus vizinhos. Além da fronteira, ambos compartilhavam identidades históricas e culturais. Nenhum tiro foi disparado, e o próprio povo do hipotético país invadido aprovou, por ampla maioria, sua submissão ao invasor. Os demais hipotéticos países europeus deram de ombros, julgando que a anexação era pontual e não lhes dizia respeito. Mas aquele exército não se deu por satisfeito. Pouco tempo depois, marchava sobre outro hipotético país limítrofe, sob a alegação de recuperar territórios cujas populações também compartilhavam afinidades culturais. Apesar da agressão, seus hipotéticos vizinhos europeus evitaram – mais uma vez – contestar com veemência a evidente política expansionista.

Fora da Europa, hipotéticos pensadores da história mundial manifestaram-se sobre aquele momento. Em um hipotético país da América do Sul, por exemplo, grandes cérebros deram suas opiniões. Seu líder – famoso naqueles tempos pela rara habilidade de comer frango com farofa sem o uso de talheres – afirmou que não via problema algum nos conflitos, uma vez que invasores e invadidos falavam a mesma língua. Questionado sobre um possível massacre, respondeu: “Falei por duas horas com o líder do hipotético país europeu, e ele me garantiu que não vai ter nenhum massacre, talquei? Manterei neutralidade no tocante a isso daí.”

Uma ex-governante do hipotético país tupiniquim concordou: “a culpa de tudo isso é do imperialismo internacional, que impôs um tratado humilhante, injusto e desigual ao povo do hipotético país europeu. Eles estão apenas se defendendo”.

Grandes jornalistas e filósofos de todas as ideologias se uniram na contemporização do conflito: o velho Janio escreveu que os imperialistas fecharam ao hipotético país europeu as vias de saída sem guerra. O jovem Jones foi ainda mais enfático ao afirmar que o hipotético país invadido tinha um governo neofascista e estava apenas colhendo o que plantou. Já o quase centenário Alexandre questionou o porquê da vigência do tal tratado, e afirmou que não se deve acuar uma hipotética grande potência.

Parte da opinião pública, influenciada por seus hipotéticos políticos de estimação, passou a tentar se colocar no lugar do líder do hipotético país invasor e entender suas motivações. Os que preferiram se colocar no lugar do hipotético povo invadido foram chamados de ingênuos, alienados e ignorantes em geopolítica. Assim, o líder do hipotético país europeu sentiu-se à vontade para continuar conquistando novos hipotéticos países e aniquilando seus povos. Sua derrota acabou ocorrendo, mas apenas às custas de um imenso sofrimento de toda aquela hipotética humanidade.

Talvez não tenhamos aprendido nada com a história. Mas isso é só uma hipótese…

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Contorcionismo cansativo…

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– USSR, bom dia.

– Uh… acho que liguei errado. Queria falar no QG do Telegram do Mito.

– É aqui mesmo. Trocamos nossa sigla todo mês, sempre de acordo com as prioridades do chefe.

– E o que essa significa?

– “Ustra Será Sempre Reverenciado”. Foi o próprio Messias quem pediu a homenagem. Disse que não para de pensar nesse grande brasileiro desde que esteve com o Putin.

– E a do mês passado, qual era?

– PFIZER – “Por que FIZERam essa merda de vacina pra criança?”

– Ah, entendi.

– Como posso ajudá-lo?

– Eu quero me desfiliar.

– Você tá brincando. Por quê? Não estamos em condições de perder mais ninguém.

– É que eu ando cansado demais.

– Cansado de quê?

– De acompanhar as mudanças. Quando estou começando a decorar todos os argumentos, vocês me pedem pra dizer o contrário.

– Que exagero.

– Exagero? Logo no início vocês me proibiram de falar que os filhos do Lula tinham que estar na cadeia. A gente ainda frequentava Twitter e Whatsapp, lembra?

– É que esse assunto de filho bandido de presidente ficou meio batido.

– Pois é, depois tive que aprender a falar bem do Centrão, a chamar o Moro de comunista, a dizer que a Lava Jato não foi aquilo tudo, a esquecer o apelido de Posto Ipiranga, a sair gritando que eu autorizo (até hoje não sei bem o quê), a…

– Mas as instruções sempre foram enviadas. Era só você seguir.

– Foi o que eu fiz. Mas é muita coisa contraditória pra gente lembrar. Não aguento mais ficar com aquela cara de “ah, é?” quando algum conhecido vem me cobrar coerência. Acabo chamando o cara de petista e saindo de perto pra não passar vergonha.

– Essa solução até que é boa.

– Uma vez ou outra funciona, mas toda hora? Não dá. Já basta o que eu passei na pandemia.

– O que houve?

– Ah, não me diga que já esqueceu. Tinha hora que era pra chamar a Covid de gripezinha, depois passou pra vírus chinês e até o termo “fraudemia” vocês me mandaram usar. Isso fora as máscaras e a vachina do Dória que não serviam pra nada, e as outras vacinas que provocavam trombose, miocardite, Aids e joanete no pé direito. Você tem ideia de como foi difícil decorar a fórmula molecular da cloroquina só pra passar credibilidade?

– E você vai desistir justo agora?

– É que a situação passou dos limites. Eu até defendi a tal viagem pra Rússia, mesmo não engolindo muito bem essa amizade com o maior aliado da China e da Venezuela. Mas não dá pra aceitar esse comportamento.

– Tenho que admitir que tem gente bem fiel ao presidente chateada com essa falta de posicionamento.

– Falta de posicionamento? Não, não é isso que me incomoda.

– E o que é, então?

– É que vocês estão dizendo que a invasão não teria acontecido se os cidadãos ucranianos estivessem armados.

– Sim, pode disparar essa verdade por aí.

– Vocês acham mesmo que os tanques, os mísseis e as tropas russas seriam impedidas por pais de família com um revólver na mão?

– Claro.

– Cara, nem eu consigo ser tão cego assim.

– Já vi que você tá quase virando comunista. É melhor cair fora mesmo antes que contamine os outros.

– Já fui. Só me responde uma curiosidade antes: vocês já sabem qual será a sigla que vão usar no mês que vem?

– OTAN – “Os Tontos Acreditam Nele”…

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Memes bélicos…

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– Alô. Vlad?

– Доброе утро, Bolsonaro.

– O que foi que ele disse? Essa tradutora simultânea tem que ser mais rápida. Bom dia? Bom dia o cacete, Vlad! Você tá querendo me ferrar?

– Você não, Bolsonaro. Quero ferrar o Biden.

– Eu também quero acabar com aquele comunista. Mas não assim. Sabia que você queimou meu filme? Tava cheio de gente acreditando que eu tinha te convencido a não entrar em guerra.

– Nem falamos sobre isso, Bolsonaro. Além do mais, aqueles ucranianos passaram do limite.

– Se eles atacaram primeiro, você tá certo em revidar. Continuo solidário à Rússia.

– Sim, foram eles que começaram.

– Lançaram mísseis, foi?

– Pior. Memes. O último foi insinuando que meu AK47 é menor do que uma pistolinha 9mm.

– Puta merda.

– Do que você me chamou?

– Nada. Não foi com você.

– Ah, bom.

– Sou solidário à Rússia, Vlad. Acho que você foi paciente até demais. Queria poder fazer o mesmo com os comunistas que me enchem o saco todo dia por aqui.

– E por que não faz?

– Porque a oposição e a imprensa não deixam.

– Não sei o que é oposição nem imprensa.

– Por isso sou solidário à Rússia.

– Obrigado, Bolsonaro.

– Mas, Vlad, tem muita gente me pressionando pra fazer uma declaração contrária à sua invasão.

– Mas você não está do nosso lado?

– Sou solidário à Rússia, mas vai pegar muito mal eu apoiar uma ação com muitas mortes. As eleições estão aí.

– Quem disse que vai ter morte? Se nenhum soldado ucraniano tentar impedir nossa invasão, ninguém vai morrer. Claro, não vamos ficar quietos se alguém vier dar uma de engraçadinho.

– Não tinha pensado nisso. Vlad, você é um humanista.

– Eu e Marighella. Posso contar com você, Bolsonaro?

– Claro. Sou solidário à Rússia. Defendemos a existência da família e, principalmente, a crença em Deus.

– Sempre acredite em si mesmo. Esse é o meu lema.

– Como disse o amigo Trump, você é um gênio, Vlad.

– Sou, Bolsonaro. Se precisar de algum conselho sobre como lidar com a… qual é o mesmo o nome?… ah, imprensa, é só me ligar.

– Talquei, Vlad. Boa sorte com aqueles ucranianos comunistas. Quero ver eles fazerem meme com você depois disso.

– Por falar em meme, acabei de receber um que mostra Jesus Cristo decepcionado com você. Ri muito.

– Ah, se o meu exército me obedecesse…

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