– Bárbara, você sabe que eu não acredito nessas coisas.
– Entra logo, Nicolas. A mulher é fera. Já se esqueceu de tudo que ela acertou quando a gente esteve aqui em 2014? A reeleição da Dilma, as manifestações, o impeachment.
– Mas ela não previu nada sobre o mito.
– Ainda tava longe do mito aparecer. Mas hoje ela vai nos dizer se ele ganha ou se vamos virar um país comunista.
– Tá bom, mas você faz as perguntas. Não gosto de papo com essa gente.
…
– Sentem-se. Vocês vieram por causa da eleição, não é?
– Ah, Madame Zohara, a senhora sempre sabe de tudo. É isso mesmo. Quem será nosso próximo presidente? Bolsonaro ou Haddad?
– Meus filhos, minha bola de cristal não mostra nomes. Mas vejo que o próximo governo será transformador.
– Graças a Deus! Transformação é a cara do mito. Será um governo de reformas, de privatizações, de crescimento, né?
– Não vejo nada disso aqui. A transformação acontecerá em outros setores.
– Na relação com o congresso? Já estava na hora do toma-lá-dá-cá acabar.
– Na verdade aqui marca um governo totalmente entregue ao Centrão, cheio de mensaleiros, inclusive nos ministérios.
– Virgem santa! A senhora está dizendo que o PT vai ganhar? Não dá pra confiar nessas urnas eletrônicas mesmo.
– Tem mais: inflação, juros, dólar e desemprego vão explodir.
– É claro que vão. É só pra isso que esse bando de corruptos presta. Que tristeza.
– (Bárbara, acho que tá na hora da gente ir.)
– (Espera, Nicolas.) Fale mais, Madame Zohara.
– O desmatamento vai bater recordes, a educação vai retroceder como nunca, e a responsabilidade fiscal será coisa do passado.
– Que Deus tenha piedade de nós. A tal transformação que a senhora mencionou é o comunismo, né?
– As maiores transformações virão na área da saúde, da política externa, e dos auxílios sociais.
– Tenho até medo de perguntar…
– O novo presidente será abertamente contrário à vacinação, o Brasil se tornará um dos maiores aliados da Rússia, e os gastos com o bolsa-família vão mais que dobrar.
– (Bárbara, chega de ouvir bobagem. Nem um governo petista seria tão ruim assim. Vamos embora.)
– (Cala a boca, Nicolas.) Madame Zohara, e nós, pessoas de bem, vamos ficar quietas?
– Claro que não. Vocês vão aplaudir…