– Guido, nosso cardápio vai mudar de novo.
– Sabia. Sempre que o chefe começa a viajar isso acontece. O que vai ser desta vez?
– Vamos acrescentar chuchu em tudo quanto é receita.
– Chuchu? O velho enlouqueceu? Ele sempre meteu o pau em chuchu, quente ou gelado.
– Pois é, eu sei. Mas agora ele diz que dá um sabor especial, tem uma certa elegância e, principalmente, traz freguesia nova.
– Sei não. Acho que o chefe esqueceu da história do filé com mandioca.
– Ah, o prato até que fez sucesso, fala a verdade.
– Fez sucesso até todo mundo descobrir que era carne de anta. O restaurante quase faliu.
– Guido, este restaurante tem público cativo. Pode até passar por maus bocados, mas não acaba de jeito nenhum.
– Nosso cardápio era bem mais variado. Tinha umas 10 páginas, lembra? Agora é só capa e contracapa.
– É só questão de tempo pros pratos que ocupavam o centro voltarem, pode apostar.
– Tomara. Não fosse a nossa famosa mariscada, acho que a gente já tinha fechado as portas.
– Isso é verdade. Não sei como sobrevivemos quando nossa matéria-prima ficou presa no porto. Tivemos que servir dobradinha disfarçada de estrogonofe. Quase ninguém engoliu.
– Nossa sorte é que o restaurante ao lado vai de mal a pior. Também, com um dono burro daqueles e um chef que não consegue acertar uma receita, nem por milagre.
– Só não fechou porque ainda tem muitos clientes fiéis. Ano que vem a gente acaba com eles, se Deus quiser.
– Tá falando do chefe?
– Também. Mas ainda não engoli essa história do chuchu.
– Acho melhor você não contrariar o homem.
– Nem pensar. Quem sabe não é esse ingrediente que vai fazer esses novatos desistirem de abrir a nova doceria aí em frente.
– Concorrente novo? A gente não precisa disso não. O que eles pretendem vender?
– Sonhos…