A implosão do bom senso…

Não foi apenas o Rio Doce que deixou de existir. Não foram apenas as centenas de vítimas em Mariana e Paris que perderam suas vidas. Não é apenas a esperança de milhares de refugiados que cessa a cada dia. E não são apenas as inúmeras crianças africanas que, diariamente, morrem em decorrência da fome e da ausência de condições básicas de vida. O bom senso também morreu.

O bom senso morreu no Brasil e morreu também em todo o mundo. E, por mais terríveis que sejam todas as mortes que testemunhamos a cada instante, a morte do bom senso é a mais preocupante delas. Porque a morte do bom senso é prenúncio da continuação e do aumento de todas as demais mortes. Com a morte do bom senso, morrem também as esperanças de que o mundo possa aprender com os próprios erros, possa se reconstruir, possa se reinventar. Com a morte do bom senso, cessam as expectativas de que o ser humano possa se tornar mais consciente do quão humano ele deixa de ser a cada dia. Com a morte do bom senso, desaparece também a noção de que o equilíbrio está no meio, e não nos extremos.

Acho que não tem mais volta. Acho que, daqui por diante, estaremos condenados a ouvir pra sempre as pessoas dizerem que é legítimo matar em nome de um deus. Ou que o deus de um é muito melhor que o deus do outro. Que a única solução para o terrorismo seria jogar uma bomba atômica no Oriente Médio e acabar com tudo. Ou que o melhor a fazer é debater, civilizadamente, sentados em uma mesa junto com os homens-bomba. Que todos os muçulmanos são terroristas e assassinos. Ou que a bondade e a índole de um povo se medem pelo quanto esse povo acredita no seu próprio deus. Que não importam os genocídios da África, pois não passam de povos menos civilizados. Ou que não devemos lamentar os ataques a uma sociedade desenvolvida, pois ela está, simplesmente, colhendo o que plantou. Que deveria caber apenas ao mercado a tarefa de selecionar as boas e as más empresas. Ou que as únicas empresas responsáveis pelos desastres ambientais no mundo são as privatizadas. Que uma tragédia no primeiro mundo tem muito mais valor e, portanto, deve ser muito mais noticiada, do que uma hecatombe em qualquer outra parte do planeta. Ou que qualquer brasileiro que se comova com essa tragédia, não passa de um demagogo virando as costas para os problemas do seu próprio país. Que uma família só pode existir a partir da união entre um homem e uma mulher, mesmo que não se amem. Ou que nenhuma criança seja tratada como menino ou menina até que possa decidir a qual gênero quer pertencer. Que a solução para um governo corrupto e incompetente é a instauração de uma ditadura militar. Ou que qualquer manifestação contrária a um governo eleito democraticamente não passa de uma tentativa de golpe. Que a vida é só uma luta do começo ao fim. Ou que, pela vida, não vale a pena lutar…

É impressionante como as pessoas, hoje em dia, conseguem transformar qualquer acontecimento, por mais lamentável que seja, em justificativa para as suas próprias linhas de pensamento, para as suas próprias ideologias. Ninguém busca entender e analisar todos os ângulos e aspectos de um evento, mas apenas aqueles que lhes convém, apenas aqueles que, na sua visão, endossam suas próprias verdades. Enaltecem um lado e se esquecem do outro. Enaltecem um lado e execram todos os outros. Como se só um lado existisse realmente. E, assim fazendo, enganam a si mesmos, matam o equilíbrio, aniquilam o bom senso.

O bom senso morreu. Pois que Deus, Alá, Cristo, Buda, Oxalá ou a própria consciência humana, possam encontrar, rapidamente, uma forma de trazê-lo de volta. Está ficando impossível viver sem ele!

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Meu presente de aniversário…

Coloco meu filho de seis anos na cama e lhe dou um beijo de boa noite.
– “Pai”, ele me chama. “Constrói um robô igual a você pra mim?”
Ele acha que sou capaz de construir qualquer coisa, desde uma casa ou um prédio até uma nave espacial.
– “Por que, meu querido?”, pergunto eu.
– “Porque eu vou ficar com muita saudade depois que você morrer. Mas, com o robô, eu vou ter sempre você perto de mim!”
Tentando conter a emoção e parecer o mais natural possível, respondo:
– “Meu amor! Não se preocupe com isso agora. O papai pretende ficar muitos e muitos anos aqui com você. Mas, mesmo que eu pudesse construir um robô igualzinho a mim, com a voz igual à minha, com os olhos iguais aos meus, esse robô jamais seria o papai de verdade.”
– “Sério, papai?”
– “Sério, meu amor. Mas eu lhe prometo uma coisa. Depois que eu morrer, você não vai precisar ter nenhum robô igual a mim, sabe porque?”
– “Não.”
– “Porque eu mesmo estarei com você sempre, ao seu lado, a todo instante!”
Então seus olhos se enchem de lágrimas e ele me dá o abraço mais doce e apertado que um pai poderia receber! A minha emoção não pode mais ser contida. E eu agradeço a ele. E eu agradeço a Deus. E eu agradeço aos meus pais, também ao meu lado. E assim começa o meu quinquagésimo ano de vida…
Feliz aniversário, Fernando!

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O “socialismo” norueguês…

Antes de sair de férias, escutei e li diversas vezes que a Noruega, primeiro dos meus destinos, poderia ser considerada o exemplo mais expressivo de um país socialista que deu certo. Adepto do livre mercado, embarquei ansioso por verificar se essa informação seria mesmo verdadeira. Depois de alguns dias visitando e conhecendo o país escandinavo, cheguei à conclusão de que a Noruega pode ser muitas coisas, menos socialista. E vou começar minha argumentação narrando um fato corriqueiro e que poderia, inclusive, ter me passado despercebido. Fiquei hospedado em quatro hotéis diferentes ao longo da minha viagem pelo país. Em nenhum deles, a apresentação do meu passaporte, o preenchimento de qualquer tipo de ficha cadastral, e nem mesmo o meu cartão de crédito foram solicitados. Exemplo bobo, não é? Mas, nesse exemplo, identifiquei algumas características que, mais tarde pude comprovar, se estendiam a esferas bem mais abrangentes da sociedade norueguesa:

Burocracia quase inexistente! Estamos acostumados, especialmente no Brasil, a lidar com papéis e documentos em quantidades cada vez maiores. Eles nos são solicitados diariamente em todos os campos. Nossos contratos são os mais extensos do mundo e, mesmo assim, não impedem que o nosso país seja o campeão de ações judiciais. Na Noruega, assim como não existe burocracia para que uma pessoa possa se hospedar em um hotel, também não existe nenhuma burocracia para se iniciar um pequeno negócio. Se um norueguês quiser abrir uma livraria hoje, ele pode. Não existem licenças ou permissões a serem solicitadas e aprovadas. Apenas alguns tipos de negócios requerem licenças prévias e, mesmo assim, essas são liberadas, em média, em menos de cinco dias. Com menos burocracia, o cidadão é incentivado a empreender e a gerar empregos.

Liberdade! O governo estabelece poucas regras. Assim como não existem determinações legais para que os hotéis guardem registros de seus hóspedes, o norueguês tem um grau de liberdade entre os mais altos do mundo, em todos os níveis. Sem o “estado vigilante”, a corrupção na Noruega é quase inexistente, as instituições funcionam, e os cidadãos pagam com prazer seus altos impostos, pois recebem de volta, através da adequada aplicação de seus recursos, um sistema educacional qualificado, um sistema de saúde amplo e eficiente, um sistema público de transporte inteligente e integrado, e o ótimo atendimento de um funcionalismo público interessado e com metas a cumprir. Até mesmo a companhia petrolífera e grande parte dos bancos, todos estatais, são geridos com uma visão empresarial, sem ingerências políticas, sem populismo e sem barreiras protecionistas.

Confiança! Foi a característica intrínseca à população norueguesa que mais me marcou. Ela é nítida não apenas nas atitudes dos atendentes dos hotéis, mas no comportamento da população de uma forma geral. O olhar do norueguês transborda confiança. Seu sorriso é desarmado. Por isso, não há catracas na maioria dos metrôs. Não há cobradores na maioria dos trens. E existe um prazer indescritível em se caminhar pelas ruas desertas de madrugada. As pessoas, nitidamente, confiam umas nas outras.

Eu nunca havia visitado um país tão singular como a Noruega. Acredito que é justamente em função dessa singularidade, que muitas pessoas, erroneamente, a classificam como uma nação socialista. Mas os fatores que listei, aliados aos baixos custo e peso do próprio estado, fazem da Noruega um país de livre mercado, no qual o governo é eficiente na sua tarefa de distribuir bem estar social a todos os seus cidadãos. Fazem com que a Noruega seja, na minha opinião, não o exemplo de um país socialista que deu certo, mas o emblemático exemplo de um capitalismo voltado para além do lucro individual. Ciente de que o lucro será sempre muito bem vindo, afinal, é também através dele que seus recursos são obtidos, o estado norueguês o incentiva e o tributa com justiça, para que, através da correta aplicação dos impostos arrecadados, possa propiciar uma alta qualidade de vida a seus habitantes.

Enfim, a Noruega é, no meu ponto de vista, a prova de que realmente existe um meio termo entre o socialismo e o, assim chamado, capitalismo selvagem. E esse meio termo jamais poderá existir em um país em que não imperem a liberdade, o interesse coletivo e a confiança. Combinação extremamente rara, mas altamente benéfica!

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A mesa ao lado…

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A felicidade da mesa ao lado contagiava todo o restaurante. Apenas três pessoas a ocupavam, mas parecia ter muito mais gente, tamanha era a alegria das gargalhadas que ecoavam pelo salão. De um lado da mesa, um filho que levava seus pais a uma inesquecível viagem pela Europa. Do outro, os pais felizes por poder apresentar ao filho o restaurante que já conheciam em Lisboa. Naquela noite, eram eles os guias da viagem. E, por mais evidente que fosse o orgulho por se perceberem exercendo uma função que não mais lhes cabia, entendiam que, àquela altura da vida, bastava-lhes desfrutar da companhia daqueles que um dia guiaram. Acho que não perceberam, entretanto, que o papel de guia exercido pelo filho estava restrito aos mapas e idiomas. Nitidamente, o filho ainda buscava no semblante de sua mãe a mesma segurança que sempre sentira quando criança. Ele ainda ansiava ouvir de seu pai os mesmos conselhos sensatos que o apaziguaram desde tenra idade. Os guias continuavam os mesmos. O aprendiz também. O aluno crescera em tamanho, mas tinha plena consciência de que muito pouco sabia. Tinha plena consciência de que, para que um dia viesse a se sentir também um guia, muito ainda teria que aprender e evoluir. Tinha plena consciência de que reconhecia em seus pais – cada vez com maior clareza – a materialização do amor pleno, e essa era a razão pela qual jamais deixaria de considerá-los seus grandes e verdadeiros guias na vida.

Durante toda a noite, fiquei escutando as conversas vindas da mesa ao lado. E pude perceber que a idolatria daquele filho por seus pais era mais do que justificável. O olhar de sua mãe transmitia uma bondade tão grande que era difícil não se emocionar ao vê-la sorrindo. E, quando seu pai também sorria, parecia que todo o restaurante se iluminava instantaneamente. A beleza e a profundidade das palavras ditas por ele faziam com que todas as outras mesas ficassem em silêncio apenas para poder ouvi-lo também. Diante de tanta sabedoria, o olhar do filho era de constante agradecimento por estar vivenciando aquele momento. Os pais, da mesma forma, agradeciam a Deus pela oportunidade de tantos brindes, tantos sorrisos, tanto amor. Foram horas inesquecíveis proporcionadas por uma mesa repleta de afeto e cumplicidade.

O atendimento do restaurante estava inteiramente comprometido. Os garçons deixavam de servir suas mesas apenas para ficar mais próximos da mesa ao lado. Cada um deles queria saborear as palavras ditas, partilhar dos sorrisos, dividir suas próprias histórias, desfrutar das experiências de vida tão ricas e verdadeiras. Da posição em que me encontrava, eu podia ver de frente o rosto daquele pai. Pode ter sido apenas impressão minha, mas a clareza daquele olhar era tão genuína que senti meu próprio olhar capturado, preso àquela imagem inebriante, entregue diante de duas janelas abertas para a alma mais pura que alguém poderia ter. Aquele olhar me dizia, com absoluta nitidez, coisas que ainda não consegui descrever em palavras. Mas não importam as palavras, importa o que eu sinto quando fecho os olhos e ainda vejo os dele. O quanto percebo a força e a dimensão de seu espírito.

Na mesa ao lado, os brindes eram feitos com vinho nacional. Assim, eu e minha esposa pedimos também uma garrafa para que pudéssemos brindar junto a eles. A mesa ao lado era extremamente generosa, e dividia a alegria de seus brindes com os das mesas vizinhas. Por fim, muitos se juntaram naqueles brindes, naquela noite, naquele restaurante em Lisboa, para sempre marcado pela harmonia da mesa ao lado. Ao final, os três pediram a conta e saíram caminhando – de mãos dadas – em direção à Praça do Rossio. Pararam em um bar para que pudessem provar uma ginjinha “com elas” e seguiram seu caminho, sempre sorrindo.

Com a mesa ao lado vazia, o restaurante tornou-se triste e sombrio. Pude então perceber que toda a alegria daquele salão vinha daquela mesa. Atordoados, eu e minha esposa deixamos nosso vinho inacabado, e saímos também em direção ao Rossio. Procuramos pela praça, pelas ruelas, pelas calçadas de pedra portuguesa, mas não mais encontramos a abençoada família da mesa ao lado. Uma angústia profunda nos arrebatou. Queríamos sentir, mais uma vez, toda a plenitude que emanava tão naturalmente daqueles seres iluminados. Os inesquecíveis momentos no restaurante nos foram bastantes, mas, egoístas, gostaríamos sempre que eles durassem um pouco mais. Mesmo assim, por maior e mais dolorosa que tenha sido a sensação de vazio por não mais poder vê-los, estou certo de que seguiram seu caminho felizes e em paz.

Através das muitas histórias que ouvi naquela noite, sei que hoje, 21 de outubro, é o dia do aniversário de 80 anos daquela mãe de sorriso doce e olhar bondoso. Sei também que aquele filho e seus irmãos sonhavam poder fazer uma grande festa em sua homenagem. Uma grande celebração a uma jornada extraordinária que sempre buscou tocar os corações de todos, até mesmo daqueles que, como eu, tiveram um dia o privilégio de se sentar por algumas horas ao seu lado. Por isso, em agradecimento àqueles instantes eternos, farei hoje uma oração e um novo brinde, especialmente dedicados a ela. Vou pedir a Deus que continue iluminando aquele olhar e aquele sorriso. Que Ele permita que aquela maravilhosa energia possa ser repartida a todos que um dia a fizeram sorrir. Que Ele faça com que a alegria que contagiou aquele restaurante possa, cada vez mais, ser multiplicada e distribuída, retornando também a ela. Que Ele conceda àquela mãe toda paz, serenidade e mansidão do Universo. Que ela possa continuar caminhando de mãos dadas junto ao amor de sua vida, como vi naquela noite memorável em Lisboa. Que Ele continue abençoando a luz daqueles dois grandes guias que, um dia, sem que tivessem percebido, mudaram inteiramente a minha vida apenas por terem se sentado em uma mesa ao meu lado.

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O Vasa e o reino de Dilma…

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Em Estocolmo, um antigo navio de guerra é o protagonista de uma curiosa história. À mostra hoje no Vasamuseet, um museu construído especialmente para ele, o navio Vasa naufragou em 1628, em sua viagem inaugural. Depois de passar 333 anos submerso, ele foi retirado do fundo do mar, restaurado, e é hoje uma das embarcações antigas mais bem preservadas de todo o mundo. Praticamente toda ela é original, pois apenas 2% de suas peças não foram encontradas ou recuperadas. É de se impressionar a beleza do navio, assim como todo o riquíssimo acervo histórico que o acompanha. E, nesse acervo, o que mais chama a atenção é a história da sua construção…

O Vasa começou a ser construído em 1626, a pedido do rei Gustavo Adolfo II. Seu desejo era que a embarcação estivesse pronta para enfrentar suas primeiras batalhas o mais rapidamente possível, reforçando a máquina militar sueca que se encontrava em plena expansão no início do século XVII. O rei Gustavo acompanhou e orientou pessoalmente muitos dos detalhes construtivos do navio. Mesmo sem entender nada de engenharia náutica, foi ele quem determinou a altura da embarcação, a largura do deck, e a quantidade de esculturas que fazia questão que adornassem o imponente navio.

Muitos séculos depois, e em um reino muito distante dali, a rainha Dilma determina aos seus subordinados que adotem uma nova matriz econômica para o seu país. Mesmo sem entender nada de economia, são dela as ideias de subsidiar setores específicos da indústria para fomentar o consumo, aumentar a carga tributária das empresas e pessoas físicas, reduzir investimentos em infraestrutura e esquecer os compromissos determinados pela lei de responsabilidade fiscal…

Em 1627, com a construção do Vasa já bem adiantada, o rei Gustavo determina que novos armamentos sejam instalados no navio, transformando-o na mais poderosa embarcação de guerra da época. A combinação de uma quilha alta com um deck estreito já trouxera sérios problemas de estabilidade ao conjunto. Agora, com o peso dos armamentos e das mais de setecentas esculturas, o Vasa não tem mais nenhuma possibilidade de equilíbrio.

Para o reinado Dilma, é dever do estado interferir em todos os setores da sociedade civil. A redução do preço da energia elétrica por decreto, o congelamento do valor dos combustíveis, e o aumento do controle sobre a iniciativa privada, são exemplos de medidas tomadas por ela. Assim, o custo de sustentação do reino aumenta tremendamente. Seu peso, mais ainda…

Vai se aproximando o momento da conclusão do navio Vasa. O ano é 1628 e o rei Gustavo exige do estaleiro a entrega do seu indestrutível navio de combate. Com ele, a guerra contra a Polônia estaria ganha. Os engenheiros navais responsáveis pela construção do Vasa já haviam percebido, há tempos, que o navio não tinha condições de navegar. Mas como dizer isso ao rei? Como admitir que gastos astronômicos, correspondentes a quase dez por cento de toda a riqueza do país, corriam o sério risco de naufragar? O rei detinha o poder supremo, ninguém poderia contrariá-lo.

No reino de Dilma, todos os ministros obedecem à risca as decisões da rainha. Alguns pequenos avisos, outros conselhos sutis, é o ponto máximo que a coragem de seus subordinados consegue atingir. Mas Dilma segue firme no seu propósito de transformar seu reino em uma mera colônia de sua própria casta. Analistas independentes e alheios à nobreza fazem críticas contundentes, mas são invariavelmente acusados de pessimistas e de traidores do reino. A rainha escuta, mas não ouve…

Com as pressões cada vez maiores do rei Gustavo, o Vasa finalmente está pronto para zarpar. Estamos no dia 10 de agosto de 1628, e ele parte para a sua viagem inaugural. Ao passar em frente à Gamla Stan, berço da cidade de Estocolmo, todas as escotilhas se abrem e os canhões são disparados para saudar o momento de glória. As imensas velas são içadas e um vento forte inclina o barco, mas não a ponto de tombá-lo. Uma nova rajada o inclina novamente, e as escotilhas abertas permitem que a água entre facilmente, inundando o Vasa. Em cinco minutos, mais de mil toneladas de madeira e uma fortuna incalculável em dinheiro jazem submersas no Mar Báltico. A primeira brevíssima viagem do Vasa termina com várias mortes e menos de uma milha náutica percorrida. Um fracasso sem precedentes. Ninguém é punido em decorrência do incidente, pois foi o rei quem solicitou e aprovou todos os detalhes. E o rei não pode ser punido, afinal, o rei é o próprio estado.

O lançamento do grande projeto do reinado Dilma já foi feito. A nova nação planejada por ela percorreu suas primeiras quatro milhas náuticas a trancos e barrancos, com inclinações sucessivamente mais fortes. A continuação do percurso previsto ainda depende de uma série de fatores, entre eles a redução urgente do peso da embarcação. As escotilhas estão abertas e a água continua entrando em quantidades cada vez maiores. Quase tão rapidamente quanto o Vasa, o reino de Dilma está naufragando. Ao contrário do rei Gustavo, a rainha Dilma poderia sim ser punida pelas suas ações e omissões. Essa punição depende de um grupo de pessoas eleitas pelos súditos que, dentre outras coisas, têm a função de verificar e cobrar eficiência das medidas impostas pela rainha. Mas a grande maioria desse grupo, animada diante da possibilidade de mais poder e recursos, simplesmente endossa as decisões tomadas por ela e, assim, perde-se sua importante função fiscalizadora. Portanto, tal como ocorreu no tempo do rei Gustavo, à exceção do próprio reino e de seu povo, ninguém será penalizado pelas tolas decisões reais…

Assim caminha o reino de Dilma rumo ao destino que ela mesma traçou. Dilma jamais conheceu a história do Vasa e, portanto, não soube usá-la como experiência própria. Uma lástima, afinal, Dilma e o Vasa têm muito em comum. Ambos criaram enormes expectativas não confirmadas. Ambos prometeram levar seus reinos a posições jamais alcançadas. Ambos esconderam por muito tempo as consequências de suas próprias desastrosas decisões.

Hoje, depois de tantos anos vendo-a modificar os rumos da nação, outrora sólidos, e diante de uma possibilidade cada vez mais remota de punição, só resta ao povo torcer para que Dilma obedeça ao brado repetido em todo o reino: Dilma, vaza!

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Dimensões…

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Tão próximas fronteiras
Diante de tão vasto planeta

Tão diminutas imperfeições
Diante de tão intensa beleza

Tão parcos problemas
Diante de tão infindáveis bênçãos

Tão desnecessário martírio
Diante de tão inevitável recompensa

Tão frívola dor
Diante de tão incomensurável júbilo

Tão irrelevantes buscas
Diante de tão constante plenitude

Tão limitados sonhos
Diante de tão infinitas possibilidades

Tão mesquinhos objetivos
Diante de tão generosas dádivas

Tão terrenas explicações
Diante de tão etéreos significados

Tão insignificantes crenças
Diante de tão grandiosa Criação

Tão medíocres escolhas
Diante de tão incontáveis caminhos

Tão infundados questionamentos
Diante de tão fundamentadas respostas

Tão efêmeras lágrimas
Diante de tão perene mansidão

Tão pobres inquietudes
Diante de tão profunda paz

Tão ínfimo eu
Diante de tão bastante Vida…

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Noruega, primeiras impressões…

Bastou olhar pela janela do avião para perceber que o destino, dessa vez, não poderia ser chamado de trivial. Após avistar as costas da Holanda e da Dinamarca, e cruzar o azul profundo do Mar do Norte, a visão que se tem ao sobrevoar a Noruega é única. A sucessão de deltas junto ao mar dão uma pequena amostra da profusão de rios e fiordes que desaguam no oceano. O azul profundo avança terra adentro, misturando-se ao verde escuro das matas nativas e ao verde claro dos impecáveis campos de colheitas diversas.

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O avião pousa no aeroporto de Oslo e a paisagem quase não se modifica. Onde estariam os distritos industriais, as fábricas, os galpões, os bairros simples que existem em toda grande cidade do mundo, principalmente junto aos aeroportos? Estaríamos mesmo chegando a uma das capitais da Europa?

O aeroporto é contemporâneo sem ser ostensivo. As formas fluidas predominam e emprestam um aspecto elegante ao conjunto inserido em uma paisagem, diria eu, modernamente rural. As imensas esteiras de bagagem funcionam bem e, em poucos minutos, me encontro no saguão principal do aeroporto à procura de uma companhia de táxi que pudesse nos levar ao centro. Informo o destino e o atendente me diz que a corrida vai custar inacreditáveis oitocentas coroas, ou quase quinhentos reais. Mais inacreditável, entretanto, é a forma como ele me diz isso. Diferentemente do que costumamos ouvir sempre que um serviço nos é oferecido, ele me informa o valor acompanhado de, praticamente, um pedido de desculpas. Mais do que isso, me diz que, se eu optar por fazer o trajeto via trem, o traslado sai muito mais em conta. Fiquei me perguntando se ele havia se desentendido com o chefe naquela manhã, mas me pareceu ser o procedimento normal de alguém querendo que o seu possível cliente tenha em mãos todas as informações para que possa tomar a melhor decisão. Agradeci e me dirigi ao local indicado por ele.

No aeroporto, haviam duas opções de trens, um da linha regular do metrô, com muito mais paradas, e o Airport Express Train, com apenas duas paradas até a estação central. Optei por esse último, uma vez que eu e minha esposa não dispúnhamos de muito tempo para visitar a cidade. O valor pago caiu para cento e oitenta coroas por pessoa, obviamente ainda muito caro para quem recebe em reais nos dias de hoje. O trem chegou na plataforma rigorosamente no horário marcado. Dentro dele, um acabamento primoroso, revistas à disposição dos passageiros, locais bem definidos para a colocação das bagagens, telas de led com informações e entretenimento em norueguês e inglês, tomadas em cada assento para que os aparelhos eletrônicos pudessem ser carregados, enfim, um espetáculo. Ao iniciarmos a viagem, cheguei a imaginar que o trem se movia através de um campo magnético, flutuando sobre os trilhos, tamanhos eram o silêncio e a ausência de vibração ao longo do percurso.

Com apenas duas paradas, rapidamente estávamos já no centro de Oslo e, consequentemente, junto ao nosso hotel. A atendente foi mais do que simpática e, solícita, nos forneceu todas as informações de que precisávamos. Ao fazermos o check-in, nos deu as chaves e, em nenhum momento, nos pediu os passaportes, o voucher, o cartão de crédito ou o preenchimento de qualquer tipo de ficha. Já havíamos previamente pago pela hospedagem, mas todos esses procedimentos são absolutamente rotineiros em qualquer hotel do mundo. Aqui, a impressão que fica, é que as pessoas confiam umas nas outras. E essa impressão foi reforçada na entrada do metrô sem catracas, e na disponibilidade espontânea de todos para nos ajudar com informações e dicas.

Todas, absolutamente todas as pessoas com as quais nos relacionamos hoje falavam inglês. Não apenas os atendentes cuja função já pressupõe esse tipo de conhecimento, mas também todas aquelas que encontramos nas ruas, no metrô, no ônibus. Por falar nisso, em poucas horas, pudemos comprovar a eficiência de um sistema público de transporte integrado e facílimo de ser utilizado com uma única consulta ao folder explicativo disponível em todas as estações.

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Na cidade, parques e praças arborizadas dão um charme de cidade do interior à capital da Noruega. No Parque Vigeland, o verde e o dourado das folhas se misturam às inúmeras e expressivas esculturas que trazem sofisticação e cultura a um ambiente público, aberto e disponível a todos, vinte e quatro horas por dia, com absoluta segurança. A Casa de Ópera, todo o complexo arquitetônico da Karl Johans Gate, e o maravilhoso pôr do sol sobre o mar apenas completaram as magníficas primeiras impressões de um país que entrega muito mais do que promete, e que, por isso mesmo, nos faz ansiar ainda mais pelos dias que teremos pela frente.

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As jabuticabeiras da mamãe…

Hoje tem jabuticaba no pé, mãe. Todas as jabuticabeiras do Canto estão carregadas de frutos. Chupei muitos deles no fim de semana e levei outros tantos para casa. Ao contrário do que costumava fazer, nem as primeiras jabuticabas foram engolidas de forma displicente. Saboreei cada uma delas como se fosse a última. E cada uma delas tinha um pouquinho da sua energia, da sua história, do seu amor. Cada uma delas nasceu de uma árvore que você plantou, adubou e regou com imenso carinho. Quando as plantou – mudas tão pequenas e com longos anos de espera até que começassem a frutificar – você chegou a duvidar que estaria aqui para provar seus frutos. Você esteve, mãe. Esteve também para plantar outras inúmeras árvores que também floriram e frutificaram. Tomando a jabuticabeira como referência, pode ter lhe parecido que a sua vida foi mais longa do que você mesma esperava viver. Entretanto, tomando a sua vida como referência, parece-me hoje que as jabuticabeiras são as árvores que mais rapidamente se desenvolvem, que mais rapidamente dão frutos.

Você se foi mas as jabuticabeiras estão aqui. Elas sentem demais a sua falta, mas não se esquecem o quanto foram cuidadas e amadas. Estão enfrentando tempos difíceis, com escassez de água e ventos fortes que as fazem vergar. Mas, mesmo assim, não tombam facilmente. Dão dando frutos, seguem suas vidas, superam as dificuldades e torcem para que muitas outras árvores sejam plantadas ao longo do caminho de cada um. Que o longo tempo até a colheita não seja empecilho para que alguém deixe de plantar. Mesmo que não venhamos a provar os frutos das árvores que plantamos, sempre haverá alguém para saboreá-los por nós e, nesse momento, olhar para o céu e nos agradecer por termos feito a nossa parte do combinado. Assim, vida, energia e amor se perpetuam. Por isso, obrigado, mãe. Jamais provei jabuticabas tão doces em toda a minha vida!

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As opções que não dispomos…

Direita ou esquerda? Como vivemos a época do extremismo, essa é uma pergunta para a qual, atualmente, não se admitem respostas vagas. É um caminho ou outro, sem meio termo. Alguém se identificar com ambas, em vários de seus aspectos e, da mesma forma, discordar de outros tantos, é, para a grande maioria das pessoas hoje, um pecado maior do que considerar Hugo Chaves um democrata (eu sei, foi uma provocação). São dois menus fechados com entrada, prato principal, sobremesa e bebida. Não posso misturar? De forma alguma! Escolha um e engula tudo. E sem reclamar!

Mas será que precisamos mesmo viver assim?

Os termos “direita” e “esquerda” tiveram sua origem na Revolução Francesa, quando os partidários do rei e do clero sentavam-se à direita enquanto os revolucionários sentavam-se à esquerda, na recém criada Assembleia Nacional Constituinte. Desde essa época, convencionou-se dizer que uma posição de “esquerda” referia-se à luta pelos direitos dos trabalhadores e da população menos favorecida, com a participação dos movimentos sociais e minorias. Um posicionamento à “direita” estaria relacionado a uma visão mais conservadora, com a busca da manutenção do poder da elite e a promoção do bem estar individual.

Mas, será que ainda estamos na Idade Moderna? O que é ser de esquerda ou de direita nos dias de hoje? Já fiz essa pergunta a inúmeras pessoas, de todas as ideologias, e não consegui de nenhuma delas sequer uma única resposta coincidente. Cada um tem o seu próprio conceito. Como não poderia deixar de ser, a visão da ideologia à qual elas afirmam pertencer é quase utópica, verdadeira fonte de todas as virtudes. Por outro lado, a imagem da ideologia contrária que elas mesmas descrevem, é praticamente a materialização de todo o mal existente no planeta. Não é preciso ser um especialista em comportamento humano para perceber que, quando atingimos tal patamar de acirramento, alguma coisa está muito errada!

Não faz muito tempo, li em uma publicação feita por um ativista, assumida e orgulhosamente ligado à esquerda, a seguinte definição: “o que é “ser de esquerda”? É ser a favor de uma sociedade que se preocupe com quem tem menos, e não ser contra quem tem mais. É pensar além do próprio umbigo, além da própria classe social. É perceber que criar políticas sociais é algo fundamental. É entender que mulheres, negros e homossexuais não querem “direitos exclusivos”, querem igualdade; é não temê-los. É reconhecer que a mulher manda no próprio corpo. É saber que a vida sexual do outro não é assunto meu (desde que, claro, se tratem de adultos e com consenso). É não acreditar que os direitos das grandes corporações se sobrepõem aos direitos do cidadão.”

Mais ou menos na mesma época, escutei a seguinte definição de um defensor da ideologia oposta: “o que é “ser de direita”? É ser a favor do capitalismo privado de mercado, do liberalismo econômico, do estado mínimo. É ser do Direito, da justiça, e a favor das liberdades individuais. É ser a favor dos valores da família verdadeira, pois ela é a base da nossa sociedade, tanto do ponto de vista moral quando cultural. É ser contra as drogas, contra a liberação destas, e a favor da criminalização do uso, do porte e da venda. É favorecer a submissão total de todas as instituições às normas estabelecidas, sempre com a reta interpretação da lei, sem deturpar o sentido das coisas.”

Como eu disse anteriormente, ainda não consegui ouvir duas opiniões absolutamente coincidentes sobre nenhuma das ideologias. Mas vamos considerar que as definições acima, além de terem sido escritas por pessoas cultas e com alto grau de escolaridade, englobam em boa parte o que cada lado pensa a respeito de si mesmo. E, uma vez que o autor da primeira exposição cometeu o pecado de não opinar mais profundamente sobre o papel do estado e como deve ser a condução da economia no pensamento “esquerdista”, posso dizer que, para a minha própria surpresa, eu me identifico tanto ou até mais com os valores descritos por ele do que com os valores descritos na conceituação de “direita”. Seria eu, então, um esquerdista disfarçado de coxinha?

O problema é que, além dessa, outras diversas perguntas passaram a me atormentar: tomando-se por base a forma como cada lado se autoavalia, os que se dizem esquerdistas acham mesmo que esse nosso governo é de esquerda? E os direitistas pensam realmente que a atual oposição é de direita? Como alguém que se posiciona como defensor de uma ideologia, qualquer que seja, consegue ainda se ver representado pelos políticos desse país? Como alguém pode ainda acreditar que a inclusão social foi conquistada graças aos princípios éticos dos nossos governantes? Como alguém pode ainda imaginar que um eventual governo da oposição vai buscar um estado realmente mínimo, livre e justo? Como todos ainda conseguem encontrar razões e motivos para defender quaisquer dos lados?

O que importa é que, enquanto nós, bobos, buscamos definições para nos encaixar nos nossos próprios rótulos, os ratos da política provam que a única ideologia que realmente lhes interessa é o Poder. E fazem de tudo, absolutamente tudo, para mantê-lo ou conquistá-lo. E, enquanto não modificarmos esse processo, não adianta continuarmos discutindo se somos de “direita” ou de “esquerda”. A única dúvida, se é que ela existe, é se somos palhaços conscientes ou palhaços ingênuos. E sinceramente, hoje em dia, também nessa questão, não sei dizer qual das opções é a menos pior!

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O mundo de Coronelino…

Coronelino é deputado federal. Ponto. Até chegou a se formar em direito, mas não por vocação. Apenas para poder fazer parte do diretório acadêmico da faculdade e, naquele ambiente propício, dar seus primeiros passos como líder estudantil. Deputado federal é, há muito, a verdadeira profissão de Coronelino. É o que ele sabe fazer.

Começou como vereador de uma pequena cidade do interior e foi galgando postos mais ambiciosos até conseguir chegar ao congresso nacional, de onde não mais saiu. Coronelino nunca ocupou cargos de destaque na câmara. Ele mesmo sempre preferiu ficar à margem das disputas pelo poder na casa. Tampouco cogitou a hipótese de disputar uma vaga no senado ou um cargo no executivo. Não são essas as aspirações de Coronelino. Ele já chegou onde queria. É quase desconhecido no país mas investe a grande parte da sua verba parlamentar nos seus próprios currais eleitorais, o que vem garantindo a ele votos para suas seguidas reeleições. Ele prefere ficar assim, na penumbra, longe dos holofotes da mídia. Seus subordinados têm a função de manter seus atos e suas contribuições muito claras aos seus eleitores, principalmente nos doze meses que antecedem cada pleito.

Coronelino sempre foi o idealista de um único ideal: manter seu emprego. Jamais foi considerado um grande orador, mas sempre conseguiu transmitir aos seus eleitores a imagem de uma pessoa séria. Para atingir esse objetivo, optou pela discrição. Ele sempre soube que, caso viesse a se destacar em demasia, correria um risco muito maior de ver questionados o crescimento absurdo do seu patrimônio, o enriquecimento anormal dos seus filhos e a participação das empresas da família na administração pública.

Apesar de pouco aparecer, Coronelino conhece todos os meandros da política e sabe articular apoios em troca de propinas e de influências. Sabe como fazer parcerias com as prefeituras da sua região e, dessa forma, beneficiar as empresas apadrinhadas nas obras e serviços próximos de seus eleitores. Sabe, principalmente, como se colocar do lado certo. E o “certo” para ele, é sempre o lado que detém o poder e as verbas.

Quando seu partido apóia um governo forte e popular, Coronelino segue à risca as orientações da liderança, mesmo entendendo, na sua limitada capacidade de discernimento, que as decisões por ele endossadas poderiam levar o país a enfrentar um caminho difícil mais à frente. Mas, quando ele percebe que seu partido passa a apoiar um governo fraco e sem comando, integra imediatamente o bloco dos que abandonam o barco à deriva. Assim, fica à vontade para continuar se posicionando em sintonia com os anseios populares. Suas decisões se baseiam sempre em dois pilares: quanto ele vai embolsar, e o que podem vir a pensar os eleitores das suas bases eleitorais, sempre sensíveis a medidas populistas e protecionistas, difíceis de serem tomadas quando o dinheiro acaba. Coronelino, dessa forma, mantém-se coerente com sua forma de agir. Mantém-se coerente com o seu ideal de manutenção do próprio emprego.

A princípio, Coronelino não apoiou o fim da permissão das doações de empresas a partidos e candidatos. Apesar de estar certo de que elas continuariam tendo todo o interesse em financiar suas campanhas, entendia que os novos esforços necessários para burlar essa determinação poderiam dificultar a sua capacidade de arrecadação. Ficou tranquilo ao ouvir de um contador que, na verdade, ao mesmo tempo em que seria mesmo exigida uma criatividade maior, também seriam bem mais difíceis os eventuais rastreamentos da origem dos recursos. Portanto, na prática, nada iria mudar. Depois desse esclarecimento, Coronelino passou a apoiar a medida.

Coronelino continua trabalhando muito nos bastidores para tentar se colocar no lugar certo. Ele sabe que a política é a arte da dissimulação e que, em um momento de intensa disputa, ele deve ter sempre na manga argumentos que justifiquem uma atitude nova ou, até mesmo, o retorno a uma postura anterior, sem que nenhum traço de incoerência fique evidente. Coronelino não tem nenhum interesse em filosofia mas, mesmo ignorando quem foi Voltaire, age como o perfeito exemplo de que “a política tem a sua fonte na perversidade e não na grandeza do espírito humano”.

Que bom, para o Brasil, que Coronelino não passa de um personagem fictício!

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