As Olimpíadas mal terminaram e já tem muita gente sofrendo com síndrome de abstinência. Tolinhos. Nossas madrugadas têm tudo para continuar insones, graças às performances de nossos representantes nas mais diversas modalidades cotidianas. Preparem-se para vibrar com nossos ginastas, que prometem não poupar emendas e conchavos na busca das ansiadas medalhas de ouro, dólar e bitcoin.
As saudades do ciclismo ficarão para trás quando nosso ministro da economia (outrora conhecido como posto Ipiranga) começar a pedalar precatórios com uma energia de fazer inveja à antiga recordista mundial da prova, aposentada em 2016. Afinal, o turbinado bolsa-família (um dia chamado de bolsa-farelo) tem que dar as caras em ano eleitoral. Quem será páreo para o populismo?
Nossos bravos atletas da economia também prometem vir com tudo em busca do ouro no salto sobre o teto de gastos. O teto, na verdade, nem existe mais, mas vai virar pó mesmo no ano que vem, quando as verbas já empenhadas voarão bem mais alto do que as manobras do surf e do skate.
As competições do tiro serão tratadas com a seriedade que merecem. Depois de uma participação pouco inspirada em Tóquio, nossos representantes vêm com força total na prova do disparo de fakenews. Novas lives bombásticas garantem deixar até os adversários – muitas vezes campeões – parecendo iniciantes na modalidade.
A ginástica artística, novo xodó de todo brasileiro, manterá sua alta performance. Os contorcionismos prometem alcançar notas inéditas, e o lugar mais alto do pódio certamente será disputado entre aqueles que reclamam do autoritarismo enquanto apoiam suas ditaduras “do bem”, e aqueles que se dizem favoráveis à liberdade mas vão para a frente dos quartéis gritar: “eu autorizo”.
As patacoadas do VAR japonês também prometem continuar. Outros bandidos serão inocentados, provas contundentes e inquestionáveis serão anuladas, tréguas, acordos e almoços serão realizados, tudo para garantir mais um ciclo olímpico de muita impunidade e roubalheira.
O espírito olímpico de união e fraternidade parece não ter futuro em nossa competição nacional. Haverá gente capaz de torcer escancaradamente contra o sucesso de uma vacina, apenas para que seu possível adversário político não se beneficie; gente que finge se indignar com qualquer indício de corrupção, depois de minimizar as falcatruas bilionárias de seus ídolos; gente que se gaba de lutar por um país honesto, mas faz de conta que não existem provas de rachadinha e enriquecimento ilícito por parte daqueles a quem juraram adoração eterna.
A medalha de ouro na prova de fanatismo sincronizado é a única que já tem donos garantidos: irão para as claques que batem palmas da mesma forma, reclamam da imprensa com a mesma intensidade, passam pano para qualquer absurdo com a mesma cara de pau, e – pasmem – acham que são antagonistas. Nem irmãs siamesas seriam tão idênticas.
Portanto, amantes do esporte, não sofram com a falta da pira olímpica (tem muita gente por aqui com vocação para incendiário), com saudades dos desfiles das delegações (amanhã mesmo teremos uma parada de tanques que promete deixar pasmo até o democrático presidente da Coréia do Norte), com a ausência de grandes disputas que exigem o máximo do ser humano (lembrem-se do que nós, brasileiros, enfrentamos a cada dia).
Que as equipes entrem em campo. Mas, convenhamos, o duro será mantê-las dentro daquelas famosas quatro linhas…