Há tempos não uso mais a expressão “chegamos ao fundo do poço”. A cada dia, os absurdos impensáveis que acontecem em todas as esferas da sociedade me fazem ter certeza de que não há fundo no nosso poço. Não há sequer perspectivas de que possamos encontrar limites para nossas próprias imbecilidades. O ano de 2024 mal começou, mas marchamos firmes rumo aos séculos passados. Preconceitos que pareciam superados, experiências vividas que prometiam ser definitivas, conhecimentos adquiridos às custas de dor e sangue que pensávamos estar incrustados em nosso DNA. De repente, percebemos que tudo isso se perdeu em alguma curva do caminho.
Muitos dizem que são casos isolados, que a maioria da população continua ciente de que não podemos retroceder. Será? Então por que tantos se calam quando uma delinquente acusa uma comerciante de ser “assassina de crianças” exclusivamente em função de sua religião? Por que grande parte da sociedade aplaude quando um dos líderes de um partido retrógrado e corrupto sugere um boicote às empresas de judeus, como nos tempos do nazismo? Por que tantas universidades públicas, que deveriam ser o celeiro de novos pensadores, admitem e até incentivam a disseminação de informações enviesadas, enquanto impedem que o outro lado exponha seus pontos de vista? Por que tanta gente permite que a ideologia se sobreponha aos fatos, e bizarrices tais como o “preconceito do bem”, “a corrupção do bem”, “a ditadura do bem” tornem-se corriqueiras?
Somos uma sociedade doente vivendo em um país doente. Um país onde as vacinas – principais responsáveis pelo aumento da expectativa de vida da humanidade – passaram a ser contestadas. Um país de conceitos fluidos, que servem – simultaneamente – tanto para acusações quanto para justificativas. Um país de justiça parcial, em que sentenças são proferidas e anuladas aos sabores dos interesses mais escusos. Um país de hipócritas que fecham os olhos para qualquer indício de irregularidades no instante em que seu bandido de estimação ascende ao poder. Um país que não aprende com seus erros.