Reencontros…

20230218_231535Foram décadas de uma relação intensa, quase rotineira. Ao longo dos anos, aprendi a me encantar por seus murmúrios introvertidos, seus monólogos inflamados, seus brados incontidos. Em contrapartida, ela jamais revelou os segredos sussurrados na volúpia de suas carícias, tampouco deixou de abençoar as orações que sucediam o êxtase de cada encontro. O tempo tratou de consolidar aquela união. Devido a circunstâncias imponderáveis, entretanto, vi-me obrigado a lhe dizer adeus. Nossa despedida foi silente, embora muito houvesse a ser dito. Não fossem as lágrimas a me denunciar, talvez ela jamais tivesse notado que nossa rotina chegara ao fim. Ela aquiesceu, pesarosa, e – uma vez mais – me abençoou.

Os mais de 5 anos de abstinência não bastaram para que nos tornássemos amantes de primeira viagem. Atentas a quaisquer variações de textura, minhas mãos partem em busca do conhecido vão que serve de impulso para o próximo movimento. Elas sabem bem onde encontrá-lo. Agarram-se a ele com o ardor que o momento exige, com a força necessária para suportar o vigoroso fluxo que me empurra de volta para a placidez da contemplação. Não, hoje não. Hoje preciso voltar a sentir toda aquela energia sobre meu corpo. Controlo a respiração ofegante antes do próximo rompante. Preparo-me para o salto no escuro que precede o clímax. Os olhos, cegos pelo turbilhão à minha frente, deixam as ações a cargo das pernas. Impulsão feita, deslizo para vencer a correnteza. Cabe agora às mãos encontrar o porto seguro escondido sob o vórtice que acaricia meu semblante. Sim, ainda somos capazes de nos reconhecer, de nos desvendar. Nenhuma artimanha foi criada durante a minha ausência. Os meandros da sedução são os mesmos, e a comunhão de corpo e água, finalmente, acontece.

Levanto-me para a oração final de cada encontro, e me deparo com a trilha vazia. Ela nota as sombras no meu olhar, e – como de praxe – me abençoa. Agradecido e emocionado, ergo novamente meus olhos em direção à trilha, e sorrio, entre lágrimas. A vida é mesmo a maior das bênçãos.

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