Ao longo da história, muitos líderes ficaram marcados pelos epítetos que lhes foram atribuídos. Margareth Thatcher será sempre lembrada como a “dama de ferro”; Gandhi, como a “grande alma”; Churchill, como o “velho leão”. Aqui pelas nossas bandas, o nome Rui Barbosa estará eternamente associado à “águia de Haia”, Juscelino continuará sendo chamado de “presidente bossa nova”, e Dilma jamais se livrará do apelido de… bem, desse todo mundo se lembra.
Hoje, mais um governante deixou o poder. Mais um governante que ficará marcado pela alcunha que ele mesmo fomentou: “mito”. O mito que Bolsonaro almejava representar era o do super-herói, do sobre-humano, daquele cujas ações estão acima de qualquer limitação. Longe disso. No final, o mito que lhe coube é o da farsa, da fábula, do engodo. Era farsa sua postura liberal e antissistema. Suas competência e honestidade não passaram de fábulas. E sua autoproclamada coragem acabou se mostrando o maior dos engodos. Bolsonaro foi responsável por um governo ideológico, corporativista, demagógico, autoritário e populista. Mas nada disso supera sua atuação criminosa no enfrentamento da pandemia. Não fosse seu descaso com a saúde da população, Bolsonaro estaria agora se preparando para o início de seu segundo mandato. Foi o primeiro presidente brasileiro a não conseguir se reeleger. Foi o primeiro presidente a perder para si mesmo.
Jair Bolsonaro deixou o país hoje, dois dias antes da posse do novo governo eleito. Será, desde a redemocratização, o primeiro presidente a não passar a faixa a seu sucessor. Seus dois grandes legados, entretanto, ficaram no Brasil. O primeiro é uma massa de seguidores fanáticos capazes de protagonizar as cenas mais patéticas e constrangedoras em frente aos quartéis de todo o país. Trata-se de um momento histórico. Não é todo dia que podemos ver parte da elite brasileira clamando a plenos pulmões por uma ditadura militar. Muitos ainda estão lá, certos de que as Forças Armadas irão impedir a posse de Lula. Enquanto os tolos, loucos e alucinados marcham, tomam chuva, e se animam a cada troca da guarda, o “mito” – depois de dois meses de um silêncio irresponsável – pegou seu banquinho e saiu de mansinho. Saiu à francesa, sem sequer se despedir de sua claque. Fugiu como o covarde que sempre foi.
Espero, do fundo do coração, que este tenha sido o último texto que escrevo sobre essa figura lamentável da história brasileira. Daqui para frente, pretendo me dedicar a crônicas motivadas pelo governo ideológico, corporativista, demagógico, corrupto e populista que está para assumir. Tenho certeza de que – infelizmente – inspiração não vai faltar.
Ah, querem saber qual é o segundo legado do governo Bolsonaro? Fiquem de olho nas transmissões da tarde de domingo. O legado estará subindo a rampa do Palácio do Planalto.