E o vento continua levando…

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– Rhett, oh, Rhett. Não suporto mais!

– O que aconteceu, Scarlett?

– Não consigo cuidar sozinha desta casa, Rhett.

– Mas Scarlett, sou eu quem cuida da Bonnie, sou eu quem faz a nossa comida, sou eu quem arruma a nossa cozinha e sou eu quem alimenta os nossos cavalos. Fora o meu emprego de fiscal do desmatamento florestal. Por que tudo tem que ser feito com madeira neste país?

– Sim, meu amor, eu sei. Não estou reclamando de você. Você cumpre bem demais o seu papel de homem cis sem lugar de fala do inclusivo século XIX. Mas esta casa é muito grande, Rhett. Só pra limpar aquela escada eu levo três dias.

– Sim, querida. Eu reconheço seu esforço. Não sei como você ainda arruma tempo para trabalhar na sua Uber-carruagem. Você me inspira, Scarlett, assim como todas as pessoas que menstruam.

– Oh, Rhett. Eu o amo tanto. Mas acho que precisamos de ajuda.

– Que tipo de ajuda, Scarlett?

– Precisamos contratar alguém que faça esses serviços domésticos pra gente.

– Scarlett, não posso crer que você queira submeter uma pessoa a tamanha humilhação. Trazer alguém para realizar serviços que são de nossa obrigação é um ultraje, é uma exploração do proletariado, é quase como se desejássemos ter escravos.

– O que são escravos, Rhett?

– Não sei, Scarlett. É só uma palavra que acabo de inventar para expressar a minha indignação diante de tão deplorável situação.

– Mas, Rhett, eu ach…

– Scarlett, você não vê… ah, perdão meu amor, acabo de cometer um abominável manterrupting com você. Conclua seu raciocínio, por favor.

– Que isso não se repita, Rhett.

– Jamais, querida.

– O que eu estava dizendo é que esse ajudante seria muito bem pago, com todos os direitos trabalhistas, inclusive férias remuneradas em Atlanta.

– Scarlett, já não basta sermos esse péssimo exemplo de família branco-heteronormativa em uma sociedade marcada pela diversidade? Não conseguiria sair na rua e encarar todos os meus companheiros da classe trabalhadora.

– Mas, Rhett, oh, Rhett, há muito não temos um tempo só nosso. O que você acha de chamarmos a Nanny para ficar com a Bonnie? Assim nós dois poderíamos passar uma tarde romântica em Tara.

– Sinto muito, Scarlett. Sei que suas intenções são boas, mas esse ato tão simples poderia facilmente ser confundido com racismo, misoginia, gordofobia e opressão patriarcal, tudo junto. Imagine o desastre, minha querida. Se ainda fosse um vídeo, poderíamos tirá-lo de circulação e pedir desculpas à sociedade, mas nossos atos não têm volta.

– O que é um vídeo, Rhett?

– Não ligue para as minhas palavras, Scarlett. Fico muito criativo quando me empolgo.

– Sim, eu sei. Mas qual é a sua sugestão, Rhett?

– Scarlett, temos que nos mudar para uma casa menor.

– Sim, Rhett, sim. Vamos nos mudar. Seremos mais felizes com uma vida mais simples. Amanhã, meu amor, será um novo dia!

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