Raras são as vezes em que conseguimos expressar, unicamente através do nosso olhar, toda a avalanche de emoções que nos envolve. Na maior parte do tempo, essa omissão é resultado de uma escolha consciente, afinal, acreditamos ser mais fortes quando conseguimos esconder nossos sentimentos mais profundos. Sentimentos são sinais de covardia, são pontos fracos prontos para serem explorados por todos aqueles que julgamos adversários na busca de uma supremacia física, psicológica, intelectual ou emocional. Como se cada um de nós participasse de uma corrida na qual apenas o vencedor pudesse atingir a glória. Somente o primeiro fosse merecedor de reconhecimento, e somente ele tivesse o direito de ser tratado como um verdadeiro líder. Tendemos, portanto, a nos postar como pessoas alheias ao turbilhão interno que cada um vivencia a cada dia.
Mas essa postura apenas esconde uma insegurança que vai além da necessidade quase inata que temos de parecer mais fortes do que somos. Porque o sentimento de vulnerabilidade, ao invés de nos diminuir, apenas nos engrandece. Só quando nos encontramos assim, vulneráveis, é que percebemos que somos capazes de sair da nossa zona de conforto e nos prepararmos para o jogo aberto, sem personagens, sem maquiagens. Uma pessoa sensata e emocionalmente estável não é aquela que oprime seus sentimentos e emoções, mas sim a que sabe lidar com eles de uma maneira positiva, buscando autoconhecimento, compreensão e crescimento.
Entretanto, existem situações na vida nas quais tudo o que mais gostaríamos é que os nossos olhos pudessem mostrar a todos o que há de mais profundo no nosso ser. Quando queremos e imaginamos que o nosso olhar está sendo mais explícito do que qualquer palavra que pudéssemos proferir. Nesses momentos, nossas emoções são tão claras para nós mesmos, que temos a certeza de que elas estão à mostra, expostas, escancaradas. Muitas vezes isso se confirma. Mas muitas vezes não. Muitas vezes a mensagem que passamos, não é sequer próxima daquela que realmente habita em nosso íntimo.
Quisera eu poder dizer àqueles que amo, apenas com o meu olhar, o quanto me orgulho deles. Quisera eu poder dizer ao meu filho pequeno o quanto o adoro e admiro, mesmo quando o repreendo mais rispidamente. Quisera eu poder dizer ao meu filho mais velho sobre tantos e tantos momentos nos quais meu olhar não buscou esconder a imensa felicidade por tê-lo ao meu lado, por vê-lo crescer como homem, como ser humano. Desde o momento em que seu primeiro choro cessou nos meus braços, meu olhar para ele só fez brilhar. Brilhou quando o vi sorrindo pela primeira vez, balbuciando suas primeiras palavras, e arriscando seus primeiros passos. Brilhou quando ele formou timidamente o seu verdadeiro grupo de amigos, e enfrentou corajosamente as situações que o impediam de se sentir inteiro. Brilhou quando o vi feliz a cada breve instante, a cada momento em que o seu sorriso era tudo o que importava. Brilhou quando percebi que as suas lágrimas de alegria transformavam um momento já sublime, em uma experiência quase etérea de felicidade. Brilhou de orgulho quando ele mostrou a personalidade de fazer suas próprias escolhas, muitas delas na contramão do caminho escolhido pela maioria. Brilhou quando ele começou a adquirir a segurança de se permitir errar, de tentar de novo e de melhorar a cada dia. Brilhou quando percebi a firmeza de um caráter grandioso, mesmo ainda em formação, e de uma índole repleta de bondade e de carinho. Brilhou de emoção cada vez que o vi sorvendo as sábias palavras da alma mais evoluída que cruzou o seu caminho, e brilhou ainda mais quando entendi que aquelas palavras realmente haviam incutido nele a certeza do quanto era uma pessoa única, singular, especial. Meu olhar brilhou e brilha a cada dia, todo dia, a cada instante e cada vez com mais frequência.
Entretanto, sei que muitas vezes ele não pôde perceber toda a intensidade desse brilho que sempre imaginei nítido nos meus olhos. Talvez porque, entre as minhas inúmeras limitações, uma das mais graves é não possuir aquele olhar doce, límpido e cristalino que emoldurava as sábias palavras que ele teve o privilégio de ouvir por tantos anos. Sei que a comparação chega a ser injusta, pois poucas são as pessoas que conseguem fazer dos seus olhos humanos uma janela constantemente aberta para a sua alma. Mesmo assim, fico extremamente feliz com a certeza de que aqueles mesmos olhos que me inspiraram ao longo de toda a minha vida, também serão sempre um parâmetro para o meu filho. E espero que, com o passar dos anos, ele também possa perceber o quanto os meus olhos, à minha maneira, sempre estarão brilhando por ele.