A festa que Rosa impediu…

O senador anfitrião foi o primeiro a chegar. Inquieto, excitado e com uma fome quase incontrolável, dirigiu-se à mesa de comida mineira que aguardava os convidados da noite. Ele passara os últimos dias alternando reuniões exaustivas com sessões de meditação auto-induzida, feitas na companhia de alguns de seus amigos mais próximos. Agora ele desejava apenas relaxar e celebrar com companheiros de longa data, boa música, bebidas caras e, claro, várias outras sessões de meditação. Tinha trabalhado arduamente para ver o dia de hoje finalmente materializado e, depois de muito tempo, voltava a sentir orgulho de si mesmo. Há pelo menos dois anos ninguém o via sorrir daquela forma. Finalizado o segundo prato de feijão tropeiro com lombo suíno, virou-se para o maître:

– Alguém deu alguma notícia?

– Estão todos chegando, senador. O senhor já quer que eu providencie a champagne?

– Sim, imediatamente.

Logo depois, a porta principal se abriu e um enorme alarido de vozes e gargalhadas ecoou pelo salão. Evidentemente radiantes com o desenrolar dos acontecimentos do dia, os convidados iniciaram a noite com um brinde regado a Don Perignon safra 2014. Geraldo, Gleisi, Farias, Serra, Renan e Fernando se confraternizavam como se fossem amigos que se reencontravam depois de anos.

Michel, evidentemente, foi o último a chegar. Aplaudido de pé, agradeceu a todos indistintamente, mas piscou discretamente para Romero que acabou por perder o terno momento de cumplicidade, pois já deixara a champagne de lado e iniciava uma nova incursão pelos sabores de um Chivas 18 anos.

Em um canto da sala, o grupo de Marcelo, Leo, Joesley e outros grandes empresários voltava a se reunir. Mais importante ainda, falavam em voz alta, adotavam um tom altivo, deixavam de lado os ultrajantes sussurros que se tornaram regra nos últimos quatro ou cinco anos. Regalias de quem não tinha mais nada a esconder.

Naquele momento, o anfitrião chamou a atenção de todos para um anúncio importante:

– Senhores, por favor. Acabo de falar por telefone com Sérgio, Eduardo e Antônio. Eles estão emocionados pelo fato da justiça, finalmente, ter sido feita e prometem que estarão pessoalmente conosco na próxima celebração.

A turba rompeu em calorosos aplausos, entremeados pelos elogios à resistência que os três demonstraram diante das calúnias e humilhações sofridas nos últimos anos. Que dia memorável!

Antes das oito da noite as luzes foram reduzidas e um grande telão desceu em local visível a todos. Começava o esperado discurso comandado pelos dois membros do grupo que não puderam estar presentes naquela celebração. Ambos apareceram diante de uma multidão eufórica. Milhares de pessoas portando camisas e bandeiras vermelhas choravam compulsivamente assistindo ao emocionado discurso de um Luís leve e solto, sempre ao lado de sua inseparável companheira. Sua voz estava mais grave do que nunca e, em seu carismático discurso, os nomes de muitos daqueles que acompanhavam pelo telão foram mencionados, sempre seguidos dos adjetivos “golpista”, “fascista” e “coxinha”. Nesses momentos, o barulho das gargalhadas no salão repleto conseguia abafar inclusive o som dos gritos estridentes vindos dos milhares presentes ao comício.

O orgulhoso anfitrião não conseguia se conter de tanta felicidade. Pouco depois, virou-se ele para o maître:

– A minha encomenda especial já chegou?

– Sim, senhor. As duas toneladas de mortadela italiana fatiada estão no caminhão frigorífico.

– Excelente. Quero que ela seja distribuída agora aos manifestantes presentes ao comício dos nossos companheiros. Não preciso dizer que ninguém pode saber quem a estará oferecendo, não é?

– Certamente que não, senhor. Mais alguma coisa?

– Sim. Mande meu motorista me apanhar na saída em dez minutos.

– O senhor não vai ficar até o final da festa?

– Não posso. Tenho um jantar marcado com um velho e querido amigo na primeira classe do próximo vôo para Lisboa.

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